12 de março de 2014

O Robocop de Elite



Desde o início eu sabia que teria dificuldades em assistir o remake de Robocop dirigido por José Padilha e não relacioná-lo ao clássico de 1987 dirigido pelo holandês Paul Verhoven, mas, porém, todavia, no entanto, fui ao cinema de mente aberta, procurando não fazer comparações entre os dois filmes para que isso não prejudicasse a minha experiência. De antemão, já posso dizer que essa libertação mental valeu a pena.

Houve muita fofoca acerca da produção de Robocop quanto a quem realmente estava dirigindo o filme, e entre comentários maldosos e verdades absolutas, o que se vê na tela, é que, de alguma forma, José Padilha venceu a batalha contra os estúdios norte-americanos (pelo menos boa parte dela), porque apesar de ser uma produção estadunidense, Robocop tem muito da cara do diretor brasileiro, e isso desde o estilo de filmagem, com as câmeras tremidas em cenas de tensão, até a linha narrativa, em especial no que diz respeito aos conflitos pessoais dos personagens. Por tudo que haviam falado quanto ao controle dos estúdios sobre diretores menos experientes em Hollywood, eu esperava ver bem menos da assinatura de Padilha no filme, mas a surpresa fora interessante.


O roteiro assinado por Nick Schenk nos leva a um futuro não tão distante (afinal 2028 está logo aí!) onde vários países do mundo são patrulhados por drones e robôs policiais que garantem a segurança do local, mantendo as pessoas longe de confusão (e com as rédeas beeeem curtas num sistema fascista!). Embora essas máquinas de justiça sejam americanas, a ironia é que o próprio povo americano se recusa a aceitá-las em seu território, incentivado pelo Senador Dreyfuss (Zach Grenier) que abomina a prática da utilização de robôs para tomar decisões delicadas como a prisão de delinquentes e a proteção de pessoas inocentes. Afinal, o que garante que essas máquinas vão mesmo fazer aquilo para o qual foram programadas?


Pensando diferente da maioria de seus compatriotas, o diretor da megacorporação responsável pela criação dessas máquinas patrulheiras (incluindo aí os gigantes ED-209) Raymond Sellars (Michael Keaton) decide que é hora de mudar esse cenário, e que sua empresa Omnicorp precisa lançar um robô com consciência humana que seja aceito pela população. 


Enquanto ele, sua equipe de marketing liderada por Pope (Jay Baruchel de Trovão Tropical e Aprendiz de Feiticeiro) e o psicanalista Norton (Gary Oldman) estudam possíveis candidatos a “homens dentro de uma máquina”, o público no cinema conhece o detetive Alex Murphy (Joel Kinnaman), um dos poucos policiais honestos no centro da corrupta cidade de Detroit. Ao lado de seu parceiro Jack Lewis (Michael K. Willians), Murphy investiga a chegada de armas pesadas ilegais às ruas da cidade, e sem saber, se envolve em uma intrincada trama de poder e cobiça que vai levá-lo a sofrer um atentado que o deixará entre a vida e a morte, tornando-se assim, o candidato perfeito ao experimento de Sellars e o Dr. Norton.


O plot não é diferente do clássico oitentista Robocop – O Policia do Futuro escrito por Edward Neumeier e Michael Miner, mas o reboot trata de forma muito mais visceral a fusão entre o homem e a máquina, dando mais tempo de tela para a transformação forçada do policial Alex Murphy em um ciborgue, logo que ele sofre o acidente que deixa boa parte do seu corpo inutilizada. 


O roteiro explora muito mais o estado psicológico do personagem, tratando-o como um soldado ferido de guerra que tem que aceitar a amputação de um membro e aprender a conviver com isso, e não só uma mente humana reprogramada em um corpo sintético. No caso de Murphy, ele tem a consciência de quem ele era antes da explosão, e a aceitação para o fato de que ele agora está preso a um corpo artificial é um ponto delicado que o texto trata, diferente do que o filme anterior fazia. Explorando mais o homem dentro da máquina, Robocop consegue lidar melhor com a questão que permeia a história: Como as pessoas receberiam a ideia de que há a mente de um homem controlando o corpo de um policial robô?

Direção

José Padilha precisou dirigir apenas dois filmes para que eu me tornasse um fã incondicional de seu trabalho. Com os dois Tropa de Elite, o diretor carioca de 46 anos movimentou o cinema brasileiro como há muito tempo não acontecia, e levou para as rodas de bar e para os círculos mais elitizados as questões que ele conseguiu abordar nos dois filmes, corrupção e violência. Com seu excelente trabalho em Tropa de Elite, parecia natural que ele se tornasse a ponta de lança para um filme como Robocop, cujo clássico de 1987 tratava justamente destes mesmos temas, corrupção e violência.


Surgiram algumas dúvidas de como Padilha iria lidar com os Milhões de Dólares que envolvem uma produção desta magnitude, e principalmente como ele iria lidar com seu ponto forte (a questão social) em meio a tantos efeitos digitais e traquitanas tecnológicas, porém, seu desempenho foi acima da média, porque o tempo todo podemos ver sua assinatura no longa metragem, sem que haja a descaracterização de seu trabalho. Com o texto de Nick Schenk forçando bastante a relação humana da história, tornando esse Alex Murphy alguém consciente de sua nova situação depois do atentado que destruiu seu corpo original, ficou fácil para Padilha trabalhar nas cenas dramáticas do longa e intensificá-las de uma maneira que o filme de 87 jamais conseguiu. 


Justificando essa carga mais emocional com o fato de Murphy não ter tido a mente apagada ao se tornar Robocop, o diretor conseguiu impor um tom mais plausível a seu filme, assim como nas cenas de ação em que ele procurou usar menos CGI e mais efeitos práticos


A questão, no entanto, é que por forçar mais nas emoções do personagem, e passar mais tempo cuidando de sua psique, ficou aquela impressão de que faltou ação no filme, e que os lampejos de tiroteio que existem na fita (como o treinamento do Robocop no galpão ao som de Hocus Pocus e na sequência final) não suprem a nossa necessidade por sangue, algo que jorrava no filme de Paul Verhoeven.


Ai, Rodman, mas meus olhinhos são sensíveis demais para aquela violência toda do Verhoeven!

Eu sei, delicado Padawan, a questão é que violência nos picos é o mínimo que se espera de um filme intitulado Robocop, devido as ingratas comparações com a fita de 87, o que dessa vez teve que ser apaziguado devido a faixa indicativa de idade (13 anos) que o filme recebeu.


A mídia manipuladora que distorce fatos para torná-los favoráveis a seu ponto de vista é representada nesse filme pelo personagem Pat Novak (Samuel L. Jackson), um apresentador de TV formador de opinião que apoia claramente apenas um lado da discussão: Os robôs devem patrulhar os EUA. No primeiro filme, a mídia e seus programas sensacionalistas são utilizadas como palco para ocultar a decadência cada vez mais palpável da sociedade, em especial da população de Detroit, que vive sob o domínio da corporação OCP


No caso de Novak, ele é um daqueles representantes direitistas (ou esquerdistas, dependendo do ângulo em que você coloca a questão “robôs devem patrulhar nosso país”) que apoia vexatoriamente um lado, e coíbe manifestações contrárias ao que ele pensa, deixando clara sua visão totalmente parcial dos fatos, exacerbado assim, no conjunto, o bem estar da população americana, que segundo o personagem, é a coisa mais importante do mundo. O ufanismo de Novak com relação a visão de que os EUA são o centro do mundo, o torna uma das críticas mais mordazes à própria mídia sensacionalista americana, algo que, por incrença que parível, os próprios americanos têm consciência que é uma das mais escrotas do mundo. Seja como for, essa parte do roteiro se torna um dos pontos altos do filme, fazendo com que ele seja ainda mais verossímil.


Salvo a falta de cenas de ação mais memoráveis (não me recordo de nenhuma que me empolgou) e o final pra lá de bunda-mole para o quesito fechamento de história, Robocop agrada sim, em especial pelos conceitos novos inseridos e pelo excelente trabalho de José Padilha, que encarou bem os norte-americanos e não permitiu que seu filme se transformasse em algo 100% controlado por um estúdio, como vimos acontecer com diversos outros longas que se tornaram fracassos de bilheteria justamente pela insistente manipulação artística. A recepção na Terra do Tio Sam pode não ter sido das mais animadoras, mas Padilha conseguiu fincar uma bandeira importante por lá, mostrando que brasileiro é mais do que Carnaval, Futebol e Corrupção. Aqui também é trabalho, meu filho!

NOTA: 8,5

Para saber mais da minha opinião sobre o Robocop de Elite do Zé Padilha, acesse o A.I.JOVEM. O AIPOD #006 é justamente sobre os dois filmes (o de 87 e o de 2014), e nele eu, o Killerdepano e o IChucky destrinchamos toda a nossa experiência com os filmes do homem de lata mais famoso do cinema. Clique na imagem abaixo para acessar o Podcast.



NAMASTE! 

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