16 de setembro de 2013

Homem de Ferro: Rapto


Tony Stark sofre um enfarte que quase o mata. Seu coração já não funciona mais como antes, o que o leva a substituí-lo por um reator energético. Ele agora vive um romance com a intrépida Pepper Potts, com um medo irracional de perder uma das únicas pessoas que realmente lhe importam e totalmente decidido a prolongar sua frágil vida humana para que assim ele não falte a Pepper, Stark decide fazer o impensável: Substituir todas as partes de seu corpo por próteses biônicas!


É com esse plot bizarro que começa o arco “Rapto”, escrito por Alexander Irvine e competentemente desenhado por Lan Medina. Embora a edição da Panini não situe seu leitor de que ponto da cronologia do Homem de Ferro estamos, fica bem claro que a história não se passa na cronologia corrente da Marvel, o que nos leva a um interessante exercício de imaginação, semelhante aos bons e velhos “O que aconteceria se...” que a própria Marvel lançava de vez em quando colocando seus personagens em situações diferentes e as vezes até inusitadas numa viagem no túnel do tempo. Alguém se lembra da clássica “O que aconteceria se Gwen Stacy não tivesse morrido?” ou da bizarra “O que aconteceria se o Justiceiro matasse todo o Universo Marvel?”?


A total ignorância sobre o enredo da HQ quando a vi na banca se reforçou ainda mais com a falta de um texto explicativo sobre do que se tratava “Rapto”, e fiquei curioso ao folhear as páginas e me deparar com a arte de Lan Medina, um desenhista filipino de 52 anos conhecido por seu trabalho no Justiceiro do selo MAX da Marvel. Os desenhos chamam muito a atenção, e embora não cheguem ao nível de um Adi Granov (desenhista e designer da saga Extremis do Homem de Ferro) deixa pouco a dever ao desenhista bósnio. Tanto as figuras humanas quanto a tecnologia do laboratório de Tony Stark, bem como suas armaduras, são detalhadamente desenhadas por Medina, e seus traços firmes e limpos são complementados pelas cores de June Chung (que entre outros trabalhos também coloriu a saga Marvel Zombies).


Sim, Rodman, mas e quanto ao enredo?

É aí que o caldo engrossa!


Como foi dito, Tony Stark entra numa neura de melhorar sua própria fisiologia humana, o que o leva a se trancar no laboratório por dias, ignorando seus amigos James Rhodey, Dra. Serrano (a psicanalista de Stark) e até mesmo a própria Pepper. Preocupados com a saúde mental do bilionário que parece estar sofrendo uma depressão pós-traumática após o enfarte, seus amigos tentam de tudo para tirá-lo de lá, até que constatam que o pior aconteceu. Ao mandarem um técnico das Indústrias Stark até o laboratório, a pedido do próprio, Rhodey e Pepper chegam a conclusão que seu velho amigo resolveu avançar alguns degraus da evolução humana, tornando-se literalmente um Homem de Ferro!


Até sua metade, Rapto funciona muito bem, instigando o leitor a continuar acompanhando a história e até manipulando-o a chegar a certas conclusões (erradas, diga-se de passagem), e todos os pontos positivos que a HQ recebe ficam localizados nessa primeira metade. Daí pra frente o roteiro fica parecendo um samba do afrodescendente desprovido das faculdades mentais.


Rapto funciona como uma daquelas leituras rápidas e de fácil digestão, porém, apresenta conceitos inovadores para o universo do Homem de Ferro, como esse desejo que Stark desenvolve de querer viver para sempre, além de metáforas válidas a mitos (gregos) como o de Prometeu, que é condenado a ter seu fígado devorado eternamente por um abutre a mando de Zeus. Alexander Irvine vai muito longe, no entanto, quando insere o tal conceito “Mundo Stark”, e uma história que parece ter potencial de início se torna uma queda livre para o abismo ao inserir elementos fantásticos demais como um “além” e idas e vindas desse lugar. Embora Irvine perca a mão do roteiro na parte final do arco, alguns momentos valem muito a pena, como essa questão levantada sobre a mescla de homem/máquina, a luta entre o Máquina de Combate e o Homem de Ferro e claro, os desenhos de Medina, que salvam a história em muitos momentos. Pra quem espera um final feliz ao estilo Marvel que estamos acostumados, uma reviravolta nas últimas páginas consegue surpreender o leitor, o que marca mais alguns pontos para Rapto.


Rapto não é nenhuma obra-prima, mas para quem espera uma leitura rápida e bons desenhos é um prato cheio.

NOTA: 6


NAMASTE!  

7 de setembro de 2013

"The Flash" daria certo no cinema?


Em uma enquete que ficou no ar entre os meses de Julho e Agosto, o Blog do Rodman perguntou a seus leitores, ainda no clima do filme do Homem de Aço, qual outro herói da DC Comics merecia uma chance nos cinemas, e foram colocados na rinha o Flash, a Mulher Maravilha, o Caçador de Marte, o Aquaman e o Asa Noturna.

Em uma disputa que começou acirrada, o Asa Noturna, o ex-Robin e parceiro do Homem Morcego de Gotham começou a ganhar vantagem nos primeiros dias de votação, mas nas semanas seguintes foi ultrapassado pelo homem mais rápido do mundo, que acabou vencendo a enquete com 38% dos votos.


Segundo os leitores do Blog do Rodman, o Flash é o herói da DC com melhor potencial para ganhar uma chance nos cinemas, agora que Batman e Superman já estão consolidados na telona e que o Arqueiro Verde parece ter encontrado seu caminho na TV. 

Mas será que um filme do Corredor Escarlate conseguiria agradar a gregos e troianos? Será que a Warner conseguiria produzir um filme que fizesse jus aos quase 60 anos do personagem (se considerarmos apenas Barry Allen como Flash), ou teríamos outra bomba ao estilo Lanterna “I Know Right” Verde?


Embora as possibilidades de um filme bem dinâmico com o personagem pareçam grandiosas para a maioria dos fãs de quadrinhos, nem mesmo a Warner parece ter ânimo para apostar em um filme solo do Flash, o que ficou bem claro na última Comic-Con, quando então os criadores do seriado Arrow (cuja primeira temporada resenhei aqui) Greg Berlanti e Andrew Kreisberg anunciaram que Barry Allen faria aparição em alguns episódios, e que isso serviria de trampolim para uma série própria com o personagem escarlate, escrita pelos mesmos idealizadores de Arrow.


Segundo informações publicadas pelo canal The CW, Barry Allen será apresentado no seriado Arrow como um legista forense de Central City (a cidade do Flash nas HQs) e que será chamado para fazer algum tipo de investigação criminal em Starling City, o que o levará a se encontrar com o vigilante local “Capuz”, que até agora não foi chamado de Arqueiro Verde em nenhum momento da primeira temporada. Como acontecerá essa interação entre os dois personagens e como será tratado o fato de Barry adquirir poderes meta-humanos em uma série, que até agora, procurou manter o pé fincado na realidade, longe de características mais fantásticas, até esse momento não sabemos. 


Só podemos torcer para que os produtores de Arrow não transformem a série em uma nova Smallville (“Somebody Saaaaaaaave me!”) e que comecem a pipocar heróis uniformizados e poderosos a cada episódio só pra atrair o público, embora isso até fizesse sentido na história do Clark Kent adolescente de 40 anos. Já em Arrow, estragaria e muito o conceito do que foi apresentado até agora de um enredo mais coeso e realista.


Pra quem não se lembra, nos anos 90 houve uma tentativa de se criar um seriado do Flash, e se os episódios não podiam ser considerados obras de arte, ao menos serviram para popularizar o personagem entre o público “civil”. A partir de então, não havia um ser humano brasileiro que não chamasse o personagem de o “The Flash”, e assim ele ficou conhecido por muitos anos até a reeducação proporcionada pelo desenho da Liga da Justiça, onde o personagem era chamado apenas de "Flash".


A série estrelada pelo ator John Wesley Shipp é hoje considerada trash, mas para a época em que quase nada sobre super-heróis era produzido, quebrava um galhão, ainda mais se levarmos em conta que ao menos os episódios eram divertidos. O traje do Flash também era muito bem feito, e embora eu lembre bem pouco do conteúdo da série, me recordo que conheci a maioria dos conceitos do personagem nessa série, já que na época eu não tinha quase nada em quadrinhos sobre o Flash.


Posso dizer que o Flash da minha geração nem sequer se chamava Barry Allen, uma vez que na época em que comecei a acompanhar as aventuras do Corredor Escarlate, Allen já havia “morrido” na Crise nas Infinitas Terras e seu sobrinho Wally West (o Kid Flash) havia assumido o manto do Homem mais Rápido da Terra. A meu ver, aliás, West é até hoje o melhor Flash de todos. Ele começou como um moleque despreparado recém-saído dos Novos Titãs e aos poucos foi se tornando um dos mais importantes personagens a vestirem o traje vermelho, tanto que muitas das características como a Força de Aceleração (basicamente a fonte de poder do Flash), e a quebra da velocidade da luz foram mais bem conduzidas quando West estava por trás da máscara e Allen continuava no além-túmulo.


Hoje, com o reboot da DC, o Flash voltou a ser Barry Allen, e mesmo antes disso, o escritor Geoff Johns já tinha dado um jeito de limar a importância de Wally West para que seu Flash preferido voltasse a integrar o panteão de heróis clássicos da editora. 



Com Barry Allen de volta aos holofotes, resta saber como será construída sua relação com os demais personagens e quais vilões estarão presentes na série produzida pela Warner... Porque tirando o Flash Reverso, na galeria de vilões do personagem só tem bucha!


Os vilões buchas do Flash

Gostei muito da primeira temporada de Arrow, e acompanharei com ansiedade os próximos episódios à espera dessa interação do Flash/Barry Allen com Oliver Queen, estendendo a torcida também para a série solo do personagem que terá a supervisão do próprio Geoff Johns, que se tornou a mente criativa por trás da DC. Já que os planos para o filme do Corredor Escarlate estão temporariamente suspensos, vamos nos contentar com o que a Warner está nos proporcionando.  


NAMASTE! 

1 de setembro de 2013

Do fundo do Baú - Eu, Wolverine


O ano era 1982. Frank Miller, agora um desenhista em ascensão, havia acabado de deixar o título do Demolidor onde havia permanecido durante quatro anos, e buscava novos ares e novos desafios. A proposta para a criação de uma história envolvendo o mutante canadense membro dos X-Men partiu de Chris Claremont, escritor que havia desenvolvido (com John Byrne) uma das mais famosas histórias dos Filhos do Átomo, a Saga da Fênix Negra.


Nessa mesma história, o Wolverine havia ganhado uma relevância dentro da equipe sem precedentes ao detonar praticamente sozinho todo o Clube do Inferno na tentativa de resgatar os X-Men das garras do clã maligno, e é claro que ele estava ganhando cada vez mais popularidade. Segundo o próprio Claremont, era hora do baixinho invocado ganhar uma minissérie só dele, e a quatro mãos começou a rascunhar o argumento para a história sobre a viagem do Carcajú ao Japão.

A princípio relutante em colocar suas mãos no personagem de ossos de adamantium, Frank Miller só se convenceu quando percebeu que podia usar na história elementos que ele gostava de lidar, como ninjas, espadas e tudo que envolve a cultura oriental (coisa que ele já havia aprendido a trabalhar com o Demolidor e a Elektra), e foi aí que surgiu um dos mais memoráveis arcos da carreira do Wolverine até hoje. E olhe que lá se foram trinta e poucos anos de lá pra cá!


Claremont criou um enredo de início simplista, mas que vai se intricando ao longo da história. Nele, Logan decide ir até o Japão quando não consegue contato à distância com uma antiga namorada chamada Mariko Yashida, e contando com o auxílio de um velho amigo nipônico chamado Asano Kimura, o mutante descobre que Mariko está casada com um importante figurão local e que ela está honrando um pedido pessoal de seu pai, que é o homem mais poderoso do país


Intrigado com aquela história, Logan visita Mariko e descobre que a moça está sendo espancada pelo marido, o que o leva a confrontar diretamente o pai da moça, o Mestre Shingen. Shingen desafia Logan a um combate com bokan, as espadas samurais de madeira usadas para treino, e após ser atingido por shurikens ninjas banhados com um poderoso veneno, o herói mutante acaba conhecendo o gosto da derrota pelas mãos do velho samurai e é desonrado diante dos olhos de Mariko.


A partir daí, uma jovem conhecida de Shingen chamada Yukio atravessa o caminho do combalido Wolverine, e juntos eles começam a percorrer as ruas do Japão em busca de aventuras, enquanto o fator de cura mutante de Logan vai recuperando seu sistema nervoso gradativamente do veneno que fez com que ele fosse vencido por Shingen. 

Enquanto Shingen continua seus planos de dominar todo o submundo criminoso, ele planeja usar Yukio para destruir de vez as pretensões do mutante para com sua filha, e o enredo gira em torno dessa vingança e da medição de força entre ambos até a conclusão do arco.


Para a galera da nova geração deve ser um choque ver o Wolverine, o herói mais casca-grossa das HQs, sendo derrotado por um velhinho empunhando uma espada de madeira, mas é importante lembrar que no contexto da narração (trinta anos atrás!) o Carcajú ainda não era esse guerreiro imortal dos dias atuais que se recupera em minutos de explosões nucleares e de banhos de ácido. Apesar de já possuir seu fator de cura, que como ele mesmo cita na história o ajudou a se livrar de diversas enrascadas, esse seu poder mutante era bem menos poderoso na época e foi assim que aprendemos a conhecer o personagem; alguém extremamente habilidoso e durão só que com limitações. Hoje em dia o cara enfrenta personagens como Ragnarok (o clone do Thor criado na Guerra Civil) e o Quinteto Fênix (Vingadores Vs. X-Men) com certa naturalidade, e mesmo quando é completamente deteriorado, ele só precisa esperar "algumas páginas" da mesma revista para se recuperar completamente, o que diminuiu e muito a graça do personagem. 


Alguém consegue imaginar hoje o Wolverine sendo fulminado por uma rajada de uma Sentinela e morrendo, como acontece em Dias de um Futuro Esquecido?


Eu, Wolverine possui muito a cara de Frank Miller apesar do argumento cheio de balões e textos gigantes como é característico do trabalho de Chris Claremont, e as cenas de ação são seu grande forte. Diferente do clima “romântico” dos anos 60, e das bizarrices dos anos 70 nos quadrinhos, os anos 80 mostravam uma violência mais explícita em suas páginas, e nessa primeira aventura solo do Wolverine já vemos sua frase clássica sendo levada a sério: “Eu sou o melhor no que faço, e o que eu faço não é bonito”. Realmente o baixinho canadense não alivia para os adversários, e em alguns quadros vemos literalmente o sangue jorrando, mesmo dos ninjas do Tentáculo que costumam evaporar quando morrem.


Em grande parte da história vemos um Wolverine enfraquecido pelos efeitos do veneno que lhe é aplicado através de shurikens, e isso é utilizado como desculpa para a forma como ele apanha feio e não mostra o tempo todo do que é capaz. É interessante notar, no entanto, que isso não faz com que torçamos menos por ele, e que mesmo avariado, o cara ainda é o melhor no que faz. Apesar da lentidão do enredo e da variação irritante no traço de Miller, que ora beira a excelência e outra beira o relaxo, Eu, Wolverine possui pontos altos muito fortes como a luta final entre Logan e Shingen que fazem valer cada centavo gasto pelo encadernado.


O Frank Miller que vemos aqui ainda é um cara que aprecia o que faz, e apesar das minhas críticas a seu traço que por vezes parecem bem irregulares, ele está em seu grande momento. Sempre curti os desenhos do cara nas histórias do Demolidor e foi com o passar do tempo que ele foi assumindo seu traço “quadrado” mais característico visto em o Cavaleiro das Trevas de 1986. Até chegar a seu trabalho mais expressivo, Miller ainda escreveu A Queda de Murdock (também de 1986) que a meu ver é a história definitiva do Homem Sem Medo da Marvel. Gabarito Miller tem e MUITO para ser lembrado como um dos artistas mais competentes da história dos quadrinhos, mesmo ele tendo ficado meio gagá com o avanço da idade. E não, nem vou citar aqui O Cavaleiro das trevas 2, ou eu seria obrigado a retirar todos os elogios feitos a Frank Miller!


Eu, Wolverine foi usado como linha base para a construção do roteiro de Wolverine Imortal lançado em 2013 nos cinemas, e apesar das diversas alterações de roteiro como a presença da Víbora e do Samurai de Prata, ainda é possível reconhecer algumas características como a presença de Mariko Yashida, Yukio e até mesmo a batalha contra Shingen, no filme vivido pelo ator Hiroyuki Sanada (o Dogen da 6ª Temporada de LOST), que lembra bastante a dos quadrinhos.


O encadernado de Eu, Wolverine foi lançado no Brasil pela Panini em 2006, e além da história original em quatro capítulos, apresenta também o Casamento de Wolverine com Mariko, história que conta com a participação dos X-Men, da Víbora (a Madame Hidra) e do Samurai de Prata que querem estragar a festa. O enredo é enrolado e confuso e termina de forma cretina, o que não chega a desvalorizar a edição cuidadosa da Panini que conta ainda com uma introdução escrita pelo próprio Chris Claremont que conta como convenceu Frank Miller a desenhar Eu, Wolverine.

Vale a pena pra quem quer saber como o filme Wolverine Imortal poderia ter sido beeeem melhor.

NOTA: 8

NAMASTE!

5 de agosto de 2013

A corrupção do Heroismo



Herói – 1.Homem extraordinário pelos feitos guerreiros, valor ou magnanimidade.
2.Protagonista de obra literária.

Magnânimo - Que tem ou denota grandeza de alma; generoso.

Fui uma criança que cresceu lendo histórias em quadrinhos de super-heróis, e como tal, aprendi a admirar os valores dos meus personagens preferidos e passei a seguir seus preceitos em minha vida real, já que não havia pessoas próximas a mim que me inspirassem da mesma forma.

Durante a minha alfabetização e mesmo depois, o Superman, o Homem Aranha, o Capitão América e os Vingadores já faziam parte do meu imaginário, e todos eles me ajudavam a ser o melhor que eu podia com seus exemplos de nunca matar, respeitar o próximo e dar o braço a torcer quando a situação exigisse. Cresci vendo Peter Parker sendo esculachado na escola pelo Flash Thompson e não revidar, mesmo sabendo que podia, vi Steve Rogers ser criticado por pegar leve com seus inimigos e vi o Superman mostrar a todos que não eram seus super poderes quase divinos que faziam dele o maior super-herói de todos os tempos, e sim a força de seu caráter e suas convicções.


O mundo atual é outro. Força de caráter, integridade, respeito pela vida humana e condescendência estão fora de moda, tais virtudes e preceitos já não convencem mais a maioria das pessoas que consomem quadrinhos e filmes baseados em super-heróis, e isso faz com que o mercado se volte para esse novo público, dando a eles o que eles querem.


Em entrevista recente, enquanto anunciava sua contratação pela Boom Comics!, o mestre George Perez, responsável pelas memoráveis Crise nas Infinitas Terras e Vingadores X Liga da Justiça, comentou um pouco sobre sua visão do atual mercado de quadrinhos e a razão pela qual ele deu as costas a DC Comics, editora que trabalhou durante um longo período de sua carreira como desenhista:

“Muitos dos personagens que eu cresci lendo e aprendendo a amar se tornaram completos estranhos pra mim… Suas aventuras são determinadas por fatores que cada dia tem menos a ver com o que conhecemos como “uma boa história em quadrinhos” e mais a ver com a forma como essas propriedades podem ser exploradas para outros fins.As decisões finais no mundo das HQs está a cada dia mais longe do âmbito editorial, Warner e Disney acreditam que podem fazer melhor o nosso trabalho, e eles são os donos do dinheiro!”

Qualquer um que tem mais de vinte anos e que lê as HQs atuais sabe do que Perez está falando. A maioria dos personagens hoje está descaracterizada e os roteiros escritos para eles não seguem sequer minimamente o que eles já representaram, o que é triste. O Capitão América do Universo 616 (tradicional) está cada vez mais parecido com o da sua versão Ultimate, e não só na aparência. Ao assumir o comando da SHIELD, Steve Rogers tornou-se mais linha dura, e mesmo com sua essência de escoteiro ainda mantida, seus atos tornaram-se mais violentos e menos consequentes, o que é de se espantar naquele que sempre foi tido com um símbolo da Marvel.


Outro que foi modernizado para agradar os fãs foi o Homem Aranha, que em sua fase atual (ainda inédita no Brasil) tem sua mente dominada pelo Dr. Octopus e se denomina Homem Aranha Superior, o que tem sido um choque para as velhas gerações de fãs que acompanham o personagem. 



Mais agressivo e com métodos pouco ortodoxos de combater o crime, o “Superior” já é tido para muitos como a melhor versão do herói aracnídeo, o que é curioso, uma vez que Joe Quesada, o diretor-chefe da Marvel, acabou com o casamento de Peter e Mary Jane na polêmica “One More Day” (resenhada por mim aqui) justamente para fazer um update nas histórias do personagem, mas o que acabou funcionando não foi o Peter Parker pobre e solteiro, e sim o Doutor Octopus (um vilão desde os primórdios) agindo como o herói aracnídeo. Quem diria que eu viveria para assistir um Homem Aranha matador fazer sucesso com a molecada!


Mesmo no cinema as coisas andaram meio negras para os super-heróis, e com isso vimos o Demolidor do Ben Affleck deixando o bandido “Quesada” morrer nos trilhos do metrô, o Batman deixando o Ra’s Al Ghul morrer dentro de um trem e mesmo o Capitão América fazendo picadinho de um soldado da Hidra na hélice de um avião. Mesmo que levemos em consideração que em filmes de ação a morte dos “malvados” seja motivo de comemoração, não dá pra deixar passar o quanto isso soa estranho para quem conhece a fundo as personalidades de nossos heróis.


As mudanças temporárias de status como o já finado “Reinado Sombrio” que colocaram vilões como Norman Osborn e Venom na “crista da onda” da popularidade da Marvel e as mudanças de marketing que refizeram todo o universo DC no polêmico Reboot pelo qual a editora passou após os eventos da saga “Flashpoint”, vieram para pavimentar de vez esse novo conceito de heróis cascas-grossas, o que sepulta cada vez mais os velhos super-heróis com a qual cresci e aprendi tanto sobre o valor da vida.  


O que me motivou a escrever esse post além das declarações de George Perez, foi na verdade o filme Man of Steel e seu polêmico final, onde um Superman não vê outra saída senão tirar a vida do General Zod. Essa atitude do personagem gerou uma discussão acalorada nas redes sociais e nos fóruns de sites especializados, e vi muita gente defendendo sua decisão com a desculpa de que “era uma guerra, ele tinha que matar mesmo!” ou então “finalmente um Superman macho!”. O próprio Zack Snyder, diretor de Man of Steel veio a público explicar sua decisão de fazer com que o Superman matasse Zod:

“...O roteiro original terminava com Zod voltando para a Zona Fantasma e desaparecendo. E eu disse ‘não, o Superman tem que matá-lo’. Ele tinha que matar porque o mundo não é mais o mesmo que era quando ele foi criado – ou quando o primeiro filme saiu. A inocência acabou.
 Não há o que fazer com ele. Isso muda o Superman de maneiras que o tornam muito mais interessante.”

Resumindo: “Maaaassa, veio!”.



Snyder praticamente sepultou o conceito que o Superman trazia consigo desde sua revitalização lá pelos anos 50, e jogou na cara de quem quisesse ouvir que esse era o Superman que nós merecemos atualmente. Não é bem que eu discorde que a humanidade hoje está atolada bem fundo na merda da falta de educação, da corrupção moral, da falta de ideais e da honradez, mas não seria justamente esse o momento em que clamaríamos por símbolos de bondade e de esperança? Não seria esse o momento em que mais precisaríamos de nossos heróis de verdade?

Como disse na resenha sobre o filme Man of Steel, esse novo Superman não inspira ninguém, e ainda ensina as crianças que, na dúvida, mate seu inimigo, pois ele não hesitaria em fazer o mesmo com você.


 Por ser muito ligado a esse universo de super-heróis desde muito pequeno, hoje me vejo em dificuldades para aceitar que meus heróis morreram de overdose e que meus inimigos estão no poder mudaram, e que eles agora atendem o clamor do público por sangue. Não sou puritano ao ponto de não aceitar personagens violentos ou de virar o rosto toda vez que jorra sangue na telona. Aliás, pelo contrário. Assim como cresci lendo HQs cujo público prioritário era o infantil, eu também fui doutrinado na lei da porrada e do tiroteio, vendo meus outros heróis do cinema matando geral em filmes como Rambo, Exterminador do Futuro e Robocop.


“Se você gosta de filmes brucutus, qual o problema em ver o Superman matando, Rodman? Como você é fresco!”

Não é que eu não aceite bem personagens que resolvem tudo no tiro e na grosseria. Eu até gosto deles. Vibrei com os dois Mercenários (resenhados aqui e aqui), até hoje vejo filmes de tiroteio em busca daquela zerada de QI do final de semana, e ainda considero Schwarzenegger, Stallone e Bruce Willis meus grandes heróis do cinema (de uma época onde filmes com super-heróis eram raros). A questão é que eu sei diferenciá-los, e meu perfil se encaixa mais com os princípios de um Homem Aranha do que de um Rambo.


Wolverine, Justiceiro e Lobo são ótimos personagens das HQs, quem não se diverte com o rastro de corpos que os três deixam por onde passam? No entanto, é importante saber que na ficção tudo é válido e o que estou trazendo aqui para discussão é o fato de que certos heróis como Superman, Homem Aranha e Capitão América deveriam continuar simbolizando aquilo para o qual eles foram criados. Desenvolver um roteiro onde o Logan retalha vilões e pára para fumar um charuto é algo natural nos gibis, mas qual a necessidade de se escrever Clark Kent matando alienígenas indiscriminadamente ou de mostrar Peter Parker adotando métodos que antes o colocavam contra caras como o próprio Wolverine?


Temos ótimos personagens violentos para destrincharmos suas personalidades (ou a falta de), não acho que seja necessário transformar todos eles, mesmo os bons, em personagens ignorantes e mal encarados. A meu ver, isso só denota uma completa falta de criatividade e um desespero grande em atender demandas de mercado. Como disse George Perez, escrever boas histórias está em último plano das editoras atualmente, o que importa é o que vende, e como hoje qualquer lixo vende...


Aceito que tudo que é feito atualmente com relação a super-heróis não é mais para caras da minha idade. Até aceito que meus conceitos de vida estejam ultrapassados e obsoletos, mas não escondo o quanto atos de bravura e coragem me emocionam nos cinemas e nas HQs, e o quanto vou ao cinema na esperança de vê-los nem que sejam em uma ceninha pós-crédito. Fui ao cinema esperando ver o melhor filme do ano com o Superman, e como resposta tive um bom filme de ação e ficção científica, porém sem qualquer alma.


Mesmo na sanha de fazer bilheteria e tirar seus estúdios da lama, outros filmes de super-heróis conseguiram me atingir de forma muito mais direta no quesito emoção. A cena de Homem Aranha 2, dirigido por Sam Raimi, em que Peter dá tudo de si para impedir a tragédia com o trem está até hoje na minha lista das mais bem executadas de todos os tempos. Não há como não se emocionar com aquela sequência em que o Aranha detém o trem sozinho e depois é reverenciado pela população que reconhece nele um verdadeiro herói. 


Sem vergonha digo que vou as lágrimas.


Uma das cenas finais de Vingadores (resenhado aqui) também mostra o reconhecimento das pessoas com relação ao salvamento feito pelos heróis, e revendo o filme recentemente fiquei emocionado em perceber que houve um cuidado para que, mesmo diante de toda a galhofa do filme, os personagens não fossem descaracterizados. Em meio ao caos o Capitão América se esforça para ajudar as pessoas do ataque chitauri, não porque ele quer, mas sim porque ele sabe que deve fazer aquilo. Para mim isso é ser um herói, qualquer deturpação nesse conceito é desespero para se lucrar e não transmitir nenhuma mensagem positiva.


Talvez eu deva parar de ler HQs uma vez que elas já não apresentam inovações em seus roteiros há muito tempo, talvez eu vá ao cinema apenas para reclamar que os personagens dos quais eu gosto não são mais os mesmos, mas duvido que do dia pra noite os manda-chuvas de Warner e Disney se conscientizem que os personagens devem ser incorruptíveis, por pior que esteja a sociedade no qual suas características se espelham e se baseiam, e que num passe de mágica eles decidam respeitar o que os fãs mais fieis pensam sobre os novos rumos tomados. Sei que o que importa é o dinheiro na atual conjuntura dos fatos, e que ideais e princípios são coisas de gente velha e gagá. Sei também que não adianta xingar muito no Twitter ou fazer protestos na Avenida Paulista que nada vai mudar, mas isso não vai fazer com que eu xingue menos.

Posso estar "ficando velho demais para essa merda", parafraseando Roger Murtaugh, mas pelo menos mantenho meus conceitos de vida intactos e incorruptíveis.

Ps.: Recentemente o escritor Grant Morrison veio a público para falar sobre a polêmica dos "heróis matadores". Abaixo o texto na íntegra:



"Não quero soar como um saudosista da Era de Prata [das HQs americanas] mas tenho notado muita gente dizendo que Batman deveria matar o Coringa e que o Superman deveria matar também, tomar para si as decisões morais difíceis que todos nós temos que fazer diariamente.
Não sei você, mas a última decisão moral que tomei não envolvia matar ninguém. Na verdade, quanto mais você pensa sobre isso - a não ser que você seja parte das Forças Armadas - matar é ilegal e imoral. Por que nós desejaríamos que os nossos super-heróis fizessem isso?"

NAMASTE! 

24 de julho de 2013

Superman - O Mano de Estilo (Review)


Houve um tempo em que o Superman era para mim O herói definitivo dentre aquelas dezenas de outros personagens coloridos que eu seguia fielmente nas histórias em quadrinhos. Ele era o ideal do “bom mocismo” e a personificação do bom caráter, além de ícone maior e símbolo de inspiração. Com o tempo, seus ideais e seu escoteirismo deixaram de me guiar, e passei a me identificar mais com outros heróis, menos simbólicos, talvez, porém mais próximos do que eu pessoalmente era.

Comentei aqui certa vez sobre o que esperava que o Superman se tornasse no cinema, e uma frase minha meio que profetizou o que veio a (não ser) Man of Steel, a nova empreitada cinematográfica do Azulão na tela grande:

“Temos que ver aquele S no peito do cara e nos lembrar do que há de melhor na humanidade ainda. Atualmente precisamos disso.

Pode parecer estranho que eu esteja me auto-parafraseando, porém o momento me pareceu oportuno de mencionar esse texto, logo que sentei para escrever minha resenha sobre o filme.

Mas e aí, Rodman? Man of Steel faz jus ao que você esperava do filme lá atrás quando escolheram o Henry Cavill?

Veremos.

 Zack Snyder, o diretor incumbido para trazer de volta à vida o personagem que parecia estar morto e sepultado para os cinemas desde Superman Returns (2006) ganhou a molecada quando dirigiu um 300 (filme baseado na HQ escrita e desenhada por Frank “Agora sou Gagá” Miller) bem fiel a sua fonte de origem, porém ganhou o ódio mortal de muitos nerds gordos e sebosos ao tentar “melhorar” a obra-prima de Alan Moore e Dave Gibbons, transportando para as telas Watchmen, tida para muitos como a melhor HQ de todos os tempos. Enchendo a história de firulas e tornando explícitas passagens singelas e discretas da HQ de Moore, Snyder não só conseguiu tirar o brilho da história, como também transformar os personagens medíocres definidos pelo autor britânico em símbolos do “massaveismo” gratuito, o que incomodou muita gente.


Por outro lado, tanto em 300 quanto em Watchmen, o “Visionário” diretor de 47 anos conseguiu alcançar um público muito maior do que o dos quadrinhos no qual seus filmes eram baseados, e essa galera curtiu o que foi feito. Para o público em geral, 300 e Watchmen são bons filmes de ação e tanto faz o que aconteceu nas HQs.

Pensando dessa forma, os executivos da Warner deram carta branca para que Snyder assumisse um dos projetos mais ambiciosos do estúdio, que era revitalizar uma franquia que estava naufragada desde 2006, quando então o insosso Superman Returns estreava nos cinemas mundiais. Com o Batman de Christopher Nolan indo de vento e popa (essa é do tempo da vovó!) e os direitos do Superman prontos a retornarem para as mãos dos familiares dos criadores do personagem (Joe Shuster e Jerry Siegel), era hora de um investimento maciço no Azulão, e eis que Man of Steel começou a ganhar forma.


Apesar de parecer a pessoa certa para a reinvenção do Superman no cinema, Snyder vinha de dois estupendos fracassos nas bilheterias (a animação A Lenda dos Guardiões e o pirado Sucker Punch), e a presença de Christopher Nolan como produtor executivo e Mestre Jedi se fez necessária. Muitos dizem que o filme só ficou tão bom porque Nolan soube puxar as rédeas de Snyder, mas há controvérsias sobre isso.


Em Krypton, papai Jor-El (Russel Crowe) e mamãe Lara (Ayelet Zurer) percebem que o planeta está entrando em colapso agora que a população usou seus recursos quase que a exaustão, e tentam avisar o conselho científico que ignora as súplicas dos representantes da casa de El. Desesperados em meio a possibilidade de uma extinção iminente, os dois decidem mandar o filho Kal-El recém nascido (o primeiro bebê nascido por meios naturais no planeta em muito tempo) para que ele sobreviva em outro planeta, e nele inserem a essência do povo kryptoniano (o Códex, chave para o renascimento da raça) antes de colocá-lo em sua nave de escape.


Enquanto o planeta começa a ruir, uma insurgência militar começa a tomar forma comandada pelo General Zod (Michael Shannon), que quer para si a chave do renascimento do povo kryptoniano. Se voltando contra o conselho científico e o próprio Jor-El, Zod acaba sendo aprisionado na Zona Fantasma, de onde vê de camarote o fim de seu planeta natal. A nave do pequeno Kal-El vai parar na Terra, Zod arruma um meio de escapar mais tarde com Faora (Antje Traue) e os demais prisioneiros, e o resto todo mundo sabe. 


Tirando a linha narrativa principal (bebê alien que cai na Terra vindo de planeta destruído que é criado por pais adotivos do Kansas e que lhe ensinam o valor da vida), muita coisa na história foi alterada de forma “elegante” por Zack Snyder e David Goyer (que também escreveu Batman Begins). Há diferenças pouco sutis no modo como o jovem Clark Kent aprende que com grandes poderes veem grandes responsabilidades seus poderes devem ser usados para o bem, e a forma dramática (muito bem representada por Kevin Costner e Henry Cavill) como isso acontece no filme foi um dos pontos positivos nessas mudanças.

Aliás, mesmo que quisessem seguir alguma linha narrativa dos quadrinhos, Snyder e Goyer ficariam um tanto quanto perdidos, de tantas origens diferentes que o personagem já teve nos últimos 20 anos!


Abstraindo que o Superman surgiu antes nas HQs e renegando todo seu passado glorioso nessa mídia impressa, é hora de conhecer o novo Superman dos cinemas, e ele é grandioso, assim como todo o universo a seu redor.

O planeta Krypton recriado para o filme é um dos mundos alienígenas mais fantásticos que tive o prazer de ver no cinema, e sua mistura de orgânico com uma ciência além de nossa compreensão é perfeito. Embasbacado em frente à tela do cinema IMAX, comecei a pensar em como os designers daqueles cenários conseguiam ter tanta criatividade para bolar algo tão bonito e ao mesmo tempo pitoresco, e como eles conseguiam imaginar cenários tão fenomenais.


Krypton de Man of Steel caberia perfeitamente em um dos filmes de Star Wars, e poderia fazer parte facilmente de galáxias compostas também por planetas como Tatooine, Naboo ou Coruscant. A parte tecnológica é ainda mais assombrosa tamanha é sua riqueza de detalhes, e itens como armaduras, veículos e prédios formam um espetáculo visual de dar inveja a qualquer filme baseado em heróis espaciais (Lanterna Verde Cof! Cof! Cof!).


A fotografia do filme é um de seus grandes pontos fortes, e o grupo de designers responsáveis pelos cenários e apetrechos, em especial na sequência inicial que mostra o planeta condenado, está de parabéns. Fiquei fascinado.

Falando de personagens e suas semelhanças com os originais dos quadrinhos, pouco se tem a acrescentar, uma vez que tirando o próprio Superman, o General Zod e Lois Lane (Amy Adams) quase nenhum deles é aprofundado. Excetuando talvez Jonathan (Kevin Costner) e Martha Kent (Diane Lane) que são basicamente o mesmo casal cuidadoso e fofo de todas as mídias nos quais já foram retratados, todos os demais personagens apresentam, senão personalidades radicalmente diferentes dos originais, ao menos nuances de alterações físicas (como o Perry “Black” White de Laurence Fishburne).



A Lois Lane da lindamaravilhosacoisamaisformosadegata Amy Adams é de longe a melhor Lois Lane já transportada para o cinema, e não só porque ela é linda, mas porque sua personagem se mostra muito mais inteligente e corajosa que suas outras encarnações. Um par de óculos jamais enganaria esta Lois Lane, e apesar da repórter investigativa do Planeta Diário não ser um ponto principal no filme, ela é de extrema importância para o Superman em si, e a forma como ele encara a própria maldição/dádiva de seus poderes.


Como a própria origem do Homem de Aço nas HQs é hoje uma colcha de retalhos, dá pra se perceber alguns fragmentos de várias histórias do personagem ao longo do filme, e referências a elas é o que não faltam. Duas histórias parecem ter servido de base principal, “O Legado das Estrelas” de Mark Waid e a origem do Superman escrita por Grant Morrison para a Era pós-reboot. O resto é uma pitada de lá e de cá de vários temperos que formam o caldinho que tornou-se Man of Steel, incluindo aí pálidas homenagens aos dois filmes de Richard Donner.


Como o General Zod nunca teve uma personalidade muito bem trabalhada todas as vezes que foi utilizado, seja nas HQs ou em outras mídias, pouco nos importamos com o que David Goyer “mudou” de seu conceito, uma vez que nada que fosse alterado seria minimamente perceptível (a menos que ele fosse um vilão afetado como todos os demais que Snyder dirigiu em seus filmes baseados em HQs). Já que é assim, vamos tocar logo na ferida: Quem é esse cara de armadura sem a cueca por cima da roupa?

O Superman clássico que conheço das HQs até o recente reboot da DC não aparece em Man of Steel. O filme mostra a história de um bebê kryptoniano que cai na Terra e que mais tarde encontra na Fortaleza da Solidão (que também não é bem a Fortaleza da Solidão) um traje azul e vermelho que passa a usar enquanto voa por aí, porém, esse cara não é o Superman.


Muito já foi questionado a respeito da decisão que o personagem título toma para deter o General Zod ao fim do filme (Snapt!), e essa decisão, por mais que faça sentido no roteiro do filme, por mais que faça jus ao que o vilão merecia naquele momento, não é uma decisão que o personagem que eu aprendi a gostar nas HQs tomaria. Seguindo o mesmo roteiro, o Superman poderia jogar Zod no vácuo do espaço ou mesmo jogá-lo no portal da Zona Fantasma antes que ele se fechasse, mas nas HQs ele jamais tomaria uma atitude como aquela.


Seja como for, a construção do personagem é muito bem feita em Man of Steel. Na infância e na adolescência ele aprende a importância de esconder seus dons fantásticos embora sinta dentro de si que precisa ajudar os mais necessitados (“grandes poderes...”), entende a preocupação que seu pai Jonathan tem em mantê-lo oculto do mundo (algo que também acontece na origem do personagem escrita por John Byrne) e cresce em peregrinação pelo mundo, vivendo como um reles mortal e aprendendo a conviver com eles. “Será que vale a pena tentar salvá-los?”, se questiona o jovem Clark Kent, e essa resposta ele só vai ter quando lá no alto dos seus 33 anos Jesus Cristo se sacrifica pela humanidade se entregando aos judeus ele se vê obrigado a intervir quando sobreviventes de seu planeta natal surgem na Terra, após uma longa procura, querendo a linhagem genética kryptoniana que (sem eles saberem de início) corre pelas veias do Homem de Aço.


Mesmo aos 33 anos, Kal-El ainda é um novato que mal sabe usar suas habilidades especiais (mesmo assim ele ainda é melhor que o Clark de Smallville que só descobriu como voar aos 40 anos!), e isso o faz cometer vários equívocos durante sua batalha épica contra Faora e os demais fugitivos da Zona Fantasma. Não dá pra ignorar o fato de que muitas pessoas devem ter morrido durante o combate entre Goku e Vegeta o Homem de Aço e Zod, e que isso poderia ser evitado se o herói fosse mais experiente, mas nem quero entrar nesse mérito, uma vez que cidades destruídas e prédios sendo esfacelados pela pancadaria entre mocinhos e bandidos é algo comum até nos quadrinhos. Nas animações da Warner/DC, por exemplo, Metrópolis só é reconstruída pra poder ser destruída no dia seguinte, e assim como nos desenhos, em Man of Steel a cidade parecia deserta enquanto o pau comia. Vai ver que nos extras do Blu-ray irão explicar que todos haviam sido teleportados pelo Sr. Destino antes da batalha. Sei lá!


Independente de ser ou não o Superman dos quadrinhos, é certo que o personagem idealizado por Goyer e Snyder para os cinemas é um novato cujo caráter ainda está sendo formado (mesmo aos 33 anos!!), e seus erros podem ser perdoados pela linha narrativa do roteiro, embora isso pareça mais uma desculpa esfarrapada para tornar o Homem de Aço mais palatável ao público médio que o enxergava como um bundão que não mata nem mosca.


Embora na maioria das vezes eu ache que Zack Snyder não passa de um Michael Bay um pouco mais evoluído, não posso ser hipócrita em dizer que ele construiu um filme ruim do Superman só porque não gostei o suficiente de sua visão para Watchmen. Man of Steel NÃO É um filme ruim. Visualmente, ele chega a ser impecável, possui um design espetacular especificamente para cenários alienígenas e para tecnologia, e soube recriar com competência as motivações do personagem título. Seja pela competência de Kevin Costner ou pela inteligência do texto escrito para ele, Jonathan Kent convence como um pai super protetor ao mesmo tempo em que ele ajuda a construir o caráter de Clark com seus conselhos, e quase fui às lágrimas com o desfecho da relação entre pai e filho lá pela metade do filme, o que nos é contado em flashbacks.


Outro ponto positivo do filme são as atuações. Praticamente todos os atores dão show de interpretação em cena, mesmo aqueles que aparecem pouco, e quase posso dizer que eles formam o time perfeito para representar os personagens do universo do Superman. Não há como não se convencer que a Lois Lane de Amy Adams é a maior repórter investigativa do mundo ao descobrir quem é o Superman em seu primeiro encontro (chupa Margot Kidder!) ou que Diane Lane é a melhor Martha Kent retratada até hoje ao consolar seu pequeno Clark quando seus poderes se manifestam pela primeira vez na escola. Até mesmo Michael Shannon convence em seu papel de vilão, e seu Zod, apesar de possuir uma razão justa para terraformar nosso planeta (foda-se! Vamos destruir a Terra em pouco tempo mesmo, manda ver, Zod!), me fez ter ódio dele ao vê-lo ameaçar acabar com toda a população da Terra. Se conseguimos odiar um personagem, é porque o ator que o interpreta é bom, e isso não dá pra negar!


Os suspiros pelo cinema a cada close em Henry Cavill (inclusive a meu lado!!) abafaram um pouco o som do IMAX durante a execução do filme, mas tirando o fato de que esse Superman é mesmo um cara bonitão, ele também é bom ator, e convenceu nas cenas dramáticas. Longe de ter o carisma de Christopher Reeve (O verdadeiro Superman), Cavill, no entanto conseguiu mandar bem quando lhe foi exigido, e fisicamente ele se assemelha muito ao que todos esperam do maior herói do planeta. Como já havia avaliado aqui no Review de Imortais, filme protagonizado pelo cara, Cavill se sai bem nas cenas de ação, e tem tudo para ser o Superman mais emblemático da nova geração, coisa que, aliás, estávamos precisando depois de terem contratado um boneco de cera para viver o personagem em 2006.


Mas como nem tudo são flores...

Vamos ao que me incomodou nessa bagaça.

Em primeiro lugar, a edição do filme é uma zona. Presente, passado, futuro, presente, passado... Nunca sabemos onde exatamente estamos, uma vez que o roteiro não se fixa em nenhum ponto quase durante o filme todo. Em geral, como aprendemos na cartilha de blockbusters de Hollywood, os flashbacks são usados com moderação até antes da metade do filme, e o passado de algum personagem nos é mostrado no início do mesmo. Em Man of Steel, todavia, isso acontece sem qualquer regra, como se numa tentativa desesperada de inovar (ou imitar Tarantino) Zack Snyder quisesse rasgar esse script hollywoodiano e fazer do seu “jeito moleque de ser”. Isso não chega a incomodar ao ponto de mandarmos o filme à merda mentalmente, mas age como uma coceirinha atrás da orelha.


O exagero pirotécnico (algo que também me incomodou muito em Homem de Ferro 3) é o segundo ponto que mais me deixou #xatiadu. Não sei se com a idade comecei a ficar menos tolerante a pancadaria desenfreada e chato para caralho para aturar mais de meia hora de destruições ininterruptas e um quebra-pau que não parecia ter fim, mas as cenas finais de combate entre Superman e os “visitantes” kryptonianos chegaram a me deixar cansado no cinema.


A meu ver, Zack Snyder passou um pouco dos limites nas cenas de luta, mas pelo visto essa medida de enfiar porradaria goela abaixo do espectador foi proposital, uma vez que as reclamações mais frequentes quanto a Superman Returns era que o filme dava sono. “Ah, é? O Superman de Bryan Synger não tinha ação? Então toma!”, deve ter pensado o Visionário. Não vi nenhum moleque falar mal das cenas massa véio do filme, então deve ser coisa de velho mesmo.


Acho que eu não teria reclamado se ao menos as cenas de luta tivessem sido melhor coreografadas ou melhor executadas. Uma das coisas que sempre critiquei ainda nas animações da DC (e olhe que adoro quase todas!) era justamente esse exagero. Cada episódio de Liga da Justiça, por exemplo, destruía uma cidade diferente, e pra mim, existem cenas melhores de luta a serem exploradas do que simplesmente ficar jogando o adversário feito peteca pelas paredes. Eu conseguiria roteirizar cenas muito melhores. Sorry!

Como disse antes, a meu ver, o Superman precisa inspirar aquele heroísmo clássico e típico de épocas mais inocentes, porém, durante o filme todo não há sequer uma cena que cause essa sensação de inspiração ou mesmo de heroísmo.

Mas Rodman, ele consegue deter aqueles tentáculos de filme pornô japonês num ato de bravura e...

Ah! Vai a merda! Aquilo é ato de bravura??



Em todo filme de herói que se preze, há pelo menos uma cena que serve como inspiração, aquela em que a trilha sonora aumenta e nos enche de adrenalina para torcer pelo personagem (como o Homem Aranha freando o trem em Spider Man 2!), e esse Superman não consegue fazer isso em nenhum momento. O fator emoção aparece no filme, mas não como simbologia de virada de roteiro ou mesmo de catarse. Embora o símbolo "S" em seu peito signifique esperança, o Superman de Man of Steel não inspira esperança em ninguém, e mais uma vez a linha narrativa colabora para acharmos que ele ainda não é o herói que conhecemos, mas que vai se tornar no futuro. 

Aham, sei! 

Nem preciso criticar aqui as aparições ao estilo Mestre Jedi de Jor-El abrindo portas e dando sugestões de ação mesmo depois de morto (e isso não é SPOILER!!) apenas para justificar o salário de Russel Crowe, né? Então tá.


Sou marvete de criação, embora a primeira HQ que li na vida tenha sido da DC (comentei aqui sobre o assunto), mas isso em nada nublou minha percepção acerca de Man of Steel. Eu queria realmente que esse filme fosse o melhor do ano, que chutasse bundas nas bilheterias e que batesse Homem de Ferro 3



Minha expectativa aumentou muito depois que vi o primeiro trailer, mas o desfecho do filme me decepcionou a tal ponto que minha nota diminuiu consideravelmente ao ver o Superman fazer o Zod parecer uma galinha indo pro abate, embora ela tenha voltado a se elevar ao ver o pequeno Clark no quintal da fazenda brincando de super-herói com a capinha nas costas... Segunda vez que fui às lágrimas durante o filme.


Man of Steel não é feito para os fãs que o personagem conquistou ao longo desses 70 e tantos anos de existência, e sim para a nova geração que solta pipa e joga bola. Os conceitos antiquados de justiça e esperança estão tão mortos quanto os zumbis de The Walking Dead atualmente, e o que os novos fãs querem é um personagem que não se difere dos demais, mas que aja com colhões na hora de resolver o assunto com os vilões. Como sou velho, ainda sou do tempo em que o Superman me inspirava a ser o melhor que eu pudesse, e que representava o bem acima de tudo, a analogia perfeita de um alienígena com poderes divinos que vem à Terra e decide se apequenar, sendo humilde o suficiente para entender que tirar uma vida, por pior que ela fosse, o rebaixaria a ser tão cruel e vil quanto os inimigos que ele jurou combater. Pode parecer babaca, mas é meu pensamento quando imagino a palavra herói.



Até hoje, não vi representação melhor do que significa ser o Superman num mundo tão violento quanto na animação Superman X Elite que resenhei aqui. Por isso, fecho minha argumentação à minha nota a Man of Steel citando essa ótima história escrita por Joe Kelly.


Ps.: Amy Adams é a Lois Lane mais linda de todos os tempos, mas Teri Hatcher ainda mora no meu coração.

Ps.2: Henry Cavill pode ser lindo, tesão, bonito e gostosão... Mas ainda come a poeira de Christopher Reeve no quesito ícone.

Ps.3: Graças a Deus não vimos Lex Luthor nesse filme do Superman. Não aguentava mais ver esse desgraçado em todas as versões para mídia do Azulão!

Nota: 8

NAMASTE!

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