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4 de junho de 2020

10 filmes para ver na Quarentena


A maioria de nós está impossibilitada de sair de casa devido a pandemia de Covid-19, que até a conclusão desta postagem, ainda estava assolando o nosso planeta, por isso, assistir filmes e séries virou mais do que passatempo corriqueiro. Virou uma questão de sanidade, já que sem essa válvula de escape, muitos de nós já teriam pirado completamente só assistindo noticiários (e eu nem estou falando só da pandemia, talkey!).

Seja nas plataformas de streaming ou na TV por assinatura, a variedade de filmes disponíveis é bem seleta, e eu separei aqui um Top 10 (sem muito compromisso de ser do "pior" para o "melhor") daqueles que mais me chamaram a atenção durante a quarentena a que estamos confinados.  


OPERAÇÃO OVERLORD


Dirigido pelo desconhecido Julius Avery, o simpático Operação Overlord foi vendido como “o filme escrito por J.J. Abrams”, fato esse que colaborou para a garantia de pelo menos metade da bilheteria (fraca) que o filme obteve no cinema.

A história de guerra situa seus personagens na França de 1944, quando uma tropa de paraquedistas americanos desembarca bem em cima das linhas inimigas, sendo obrigada a se separar sob fogo cerrado. Quando os sobreviventes da queda conseguem se reagrupar, eles partem para cumprir a missão que eles acreditam ser a desativação de uma base inimiga, mas já em seu destino, acabam descobrindo que os nazistas estão planejando algo muito mais grandioso e mortal contra os Aliados.

Mathilde Ollivier e Jovan Adepo em cena

Muitos filmes já colocaram os nazistas e seu comandante como estudiosos do oculto, das forças malignas, e com isso, Operação Overlord consegue juntar dois gêneros muito populares em Hollywood que é “filme de guerra” com “filmes de zumbis”. O que aconteceria se Hitler tivesse encontrado uma forma de reviver os mortos e torná-los os soldados perfeitos para sua conquista mundial?


Overlord (que também foi o nome dado à missão de invasão da Normandia durante a 2ª Guerra) rendeu apenas US$ 41 milhões de um orçamento de US$ 38 milhões, mas não chega a ofender a inteligência de ninguém, sendo um ótimo divertimento de quase duas horas e com uma história interessante de ser acompanhada. Os personagens são cativantes e o filme possui cenas de violência beeeem gráficas, em especial quando vai se aproximando mais do seu final. Além do protagonista Jovan Adepo, o elenco ainda conta com a belíssima atriz e modelo francesa Mathilde Ollivier (que possui o arco mais dramático do filme, em busca do irmão raptado), o ator Wyatt Russell (que vai ser o John Walker/Agente Americano na série da Marvel Soldado Invernal e Falcão) e Iain De Caestecker (o Agente Fitz de Agents of SHIELD). Como filme de guerra, não chega a ser um Resgate do Soldado Ryan ou um 1917, mas possui vilões muito bons que vão fazer o desfecho valer ainda mais a pena.

Wyatt Russel

Como tem nazistas na história, vai agradar parte dos eleitores do atual presidente do país! 

Nota: 7

Disponível no catálogo do Telecine.

A BABÁ


Depois de As Panteras: Detonando (2003) e Exterminador do Futuro – A Salvação (2009), nunca mais achei que veria outra coisa dirigida por McG, mas acabei assistindo A Babá na total ignorância de que era o cara por trás das câmeras.

Diferente de Terminator Salvation que era para ser levado a sério, A Babá (filme de 2017) subverte completamente o gênero terror, tornando o filme uma comédia galhofa de ótima qualidade. O plot inicial nos mostra o medroso protagonista Cole (Judah Lewis) como o único menino do bairro que ainda tem uma babá para cuidar dele quando os pais saem de casa, fato que gera muito constrangimento e bullying com ele na escola. Cheio de fobias e incapaz de enfrentar os bullies do bairro, Cole tem como única amiga a vizinha Melanie (Emily Alyn Lind), além de contar com a proteção de Bee, a sua Babá.

Judah Lewis e Samara Weaving

Bee se mostra uma verdadeira parceira “nerd” para o menino, e as horas que os dois passam juntos na ausência dos pais dele são sempre muito bem aproveitadas, com várias atividades que deixariam qualquer moleque adolescente simplesmente apaixonado pela babá. Destaque para a cena em que os dois escolhem uma equipe para combater invasores alienígenas cheia de referências nerds, que vai de Capitão Kirk ao Xenomorfo de Alien.

Tudo corre muito bem na vida de Cole, até que ele descobre numa noite a razão pela qual Bee o dopa todas as noites, para mantê-lo em sono profundo: Ela é uma assassina adoradora do Diabo que quer seu sangue inocente para ganhar tudo aquilo que almeja.


A partir dessa descoberta, o filme vira um delicioso thriller em que cenas cada vez mais absurdas inundam a tela até o desfecho da história. A Babá de McG é dirigido com ótimas tomadas de câmera que às vezes coloca o espectador na visão do menino Cole, além de uma edição muito caprichada e veloz que exprime graficamente as emoções do protagonista com textos e efeitos digitais. É bem incrível o que o diretor consegue fazer nas cenas de ação sem exagerar no CGI (algo que era terrível em As Panteras!), mas independente dos efeitos visuais, o carisma de todos os personagens segura muito bem a história. Além de Judah Lewis, o filme conta com a lindíssima Samara Weaving como Bee, Leslie Bibb (a jornalista que vai pra cama com Tony Stark em Homem de Ferro 1) como a mãe de Cole e Robbie Amell (o Nuclear caucasiano do Arrowverso) como um dos amigos adoradores do demônio de Bee.


O desfecho é de partir o coração, mas A Babá vale muito a pena para um domingo à noite de bobeira na quarentena.

Nota: 8

Tem na Netflix. 

P.S. - Não confundir com A Babá (2018) de Joel Novoa, que esse sim, é um filme de terror roots, de dar cagacinho.

A NOITE É DELAS


Rough Night (2017) é um daqueles filmes que conquista seu interesse só pelo trailer, mas que por uma razão ou outra, a gente não consegue assistir no cinema. Dirigida pela diretora italiana Lucia Aniello, a comédia rasgada nos coloca para rir quase que do começo ao fim com um grupo de amigas dos tempos da faculdade que decidem sair numa viagem para comemorar a despedida de solteira de uma delas, Jess, a personagem vivida por Scarlett Johansson. Elas agora seguem vidas completamente diferentes da época em que dividiam uma república. 


Jess é candidata a um alto cargo no governo, Alice (Jillian Bell) tornou-se professora do primário, Blair (Zoë Kravitz, a próxima Mulher Gato de The Batman) é uma empresária bem-sucedida divorciada e com um filho e Frankie (Ilana Glazer) que nos tempos da faculdade namorava Blair, agora é uma ativista feminista. Quando as moças se reencontram, meio que rola uma tensão entre elas, e fica nítido ao espectador que elas não parecem ser tão amigas assim. Essa tensão dura até o momento em que elas chegam na casa em Miami onde vão passar aqueles dias, quando então a nova melhor amiga de Jess, chamada de “Kiwi” (Kate McKinnon) se junta ao grupo, causando ciúmes na controladora Alice.

A engraçadíssima Kate McKinnon e Scarlett Johansson

Os problemas do grupo começam realmente quando uma das garotas decide contratar um Go-Go Boy para entreter a noiva Jess e acidentalmente elas acabam matando o cara. E isso não é spoiler, porque tem no trailer. A partir daí as confusões para elas se safarem daquele problema sem prejudicar suas vidas e suas carreiras criam as situações mais hilárias do filme, nos prendendo firmemente ao sofá até o desenrolar da história. A personagem de Kate McKinnon com seu sotaque australiano e seu jeito meio destrambelhado rouba fácil a maior parte das cenas de humor (destaque para o acidente de jet-ski!), o que torna o filme uma das grandes surpresas do gênero comédia. 

Como é de praxe, o filme tem citações e insinuações sexuais para caralho, só que o mais interessante nesse ponto é que agora estamos vendo tudo pela ótica feminina, já que é uma mulher atrás da câmera. Não espere, portanto, personagens sexualizadas ou estereotipadas em A Noite é Delas, já que isso não acontece em nenhum momento.


Aniello tem um estilo muito próprio de filmar as cenas mais movimentadas, e até as sequências óbvias acabam causando risos, mesmo nos momentos mais prováveis. A Noite é Delas é para ver com os amigos reunidos na sala, mas como isso vai contra as recomendações de isolamento social da OMS, pode assistir em casa de casalzinho que também vale a pena. O filme ainda conta no elenco com o ator Colton Haynes (o Ricardito do Arrowverso) como um garoto de programa e com a sumida Demi Moore, que interpreta a vizinha ninfomaníaca da casa em Miami.

NOTA: 9

Está disponível na Netflix.   

OS 7 MAGNÍFICOS


Eu tenho uma certa preguiça para filmes de “bang bang” (como diria minha mãe), mas confesso que o que me chamou a atenção no western Os 7 Magníficos (2016) foi seu elenco. Dirigido por Antoine Fuqua, o longa é um remake de um filme homônimo da década 1960, que também já era baseado no japonês Os Sete Samurais de 1954. Fuqua tem no currículo o excelente Dia de Treinamento (2001), filme que rendeu o Oscar de melhor ator a Denzel Washington, merecidamente, além de vários outros filmes também protagonizados pelo ator.


O enredo conta a história do oficial negro Sam Chisolm (Denzel Washington) que decide aceitar a recompensa paga por Emma Cullen (Haley Bennett) para libertar o seu vilarejo das garras tirânicas de Bartholomew Bogue (Peter Sarsgaard), um barão industrialista que quer se beneficiar das minas existentes no lugar. Bogue chega no vilarejo com toda sua força armada e exige que os moradores vendam suas casas a preço de banana. No processo, ele acaba matando aqueles que se rebelam, deixando Emma viúva. É aí que ela reúne os poucos recursos que o lugar tem e decide contratar caçadores de recompensa para acabar com Bogue e seu bando. Embora não seja um caçador de recompensas, Chisolm decide aceitar o serviço ao saber quem está envolvido nele, reunindo os melhores homens da região para ajudá-lo naquela missão praticamente suicida.


Os “sete” do título são formados, além de Chisolm, por Faraday (Chris Pratt, o Starlord de Guardiões da Galáxia), Goodnight Robicheaux (Ethan Hawke), Jack Horne (Vincent D’Onofrio, o Wilson Fisk da série do Demolidor da Netflix), Billy Rocks (Byung-hun Lee) o especialista em facas, o mexicano Vasquez (Manuel Garcia-Rulfo) e Red Harvest (Martin Sensmeier) o índio Comanche solitário que decide se juntar a eles no caminho. O filme tem sequências espetaculares de ação, regadas com muito tiroteio, explosões, empalamentos e flechadas. Todo o elenco está muito bem em cena, conduzido pela direção firme e talentosa de Fuqua. Cada personagem, por possuir uma habilidade específica (além de só saber apertar um gatilho), é explorado unicamente em suas características, o que também pode ser observado com relação a suas personalidades. Nesse quesito talvez os dois únicos que saem perdendo, não tendo tanto tempo de tela quanto os demais, são o Comanche e o mexicano, que tem pouco de suas personalidades explorada no roteiro.

Haley Bennett, Chris Pratt e Peter Sarsgaard

A interação do elenco é uma das melhores coisas sobre esse filme, o que faz o tiroteio final ser tão empolgante quanto doloroso.

Nota: 8

Está disponível na Netflix.   

NA NATUREZA SELVAGEM


Um pouco antes desse filme voltar a ser comentado em 2020 devido a história do brasileiro que decidiu seguir os passos de Christopher McCandless até o Alaska, eu resolvi finalmente dar uma chance a ele, após ser citado em um podcast que ouvi. Na Natureza Selvagem (2008) esteve disponível na Netflix por algum tempo, mas acabei tendo que apelar para meios alternativos para assisti-lo já que ele foi tirado do catálogo.


Dirigido pelo também ator Sean Penn, o filme é baseado em Into the Wild de Jon Krakauer, livro que conta a história real de Christopher McCandless, o jovem de 23 anos que decidiu largar toda sua vida de luxos e riquezas para embarcar em uma viagem de autoconhecimento até o Alaska. McCandless (ou Alexsander Supertramp) simplesmente desaparece após se formar na faculdade, não deixando qualquer rastro para trás e abandonando completamente sua vida anterior. Bens materiais, família... Tudo é colocado em segundo plano enquanto ele decide trilhar seu próprio destino até o Alaska, onde ele, por um infortúnio, jamais conseguiu chegar.


McCandless é competentemente interpretado por Emile Hirsch no filme e o ator mergulhou fundo (literalmente!) no papel, dispensando dublês em cenas mais perigosas (como a que desce uma corredeira de caiaque) e até encarando um urso de verdade. Hirsch ainda aceitou provações físicas para se aproximar perfeitamente ao estado em que o verdadeiro Christopher deve ter chegado em seus últimos dias, privado de alimentos, e o ator está só pele e osso nas últimas cenas.


Na Natureza Selvagem, como dá pra perceber até aqui, não é um filme de fantasia com final feliz, mas todo o processo (egoísta sim) de descoberta pelo qual o personagem passa em sua história é uma das mais comoventes que já assisti em um drama. Todo o clima de melancolia e solidão (embora o personagem se negue a ser depressivo ou mesmo triste) do enredo fica ainda melhor sentido pelas canções e pela trilha sonora composta por Eddie Vedder (o vocal do Pearl Jam), Michael Brook e Kaki King. Toquei essa trilha incessantemente por algumas semanas no Spotify, tentando absorver tudo que o filme acabou representando para mim. Chorei e não foi pouco ao final do filme, e de uma forma ou outra, acabei me perguntando se eu não faria algo parecido com o que o protagonista fez. Às vezes, por mais que isso seja egoísta e idiota, o isolamento total até a morte parece ser a única resposta para as dores diárias da vida e a total falta de propósito. Mas esse é meu lado depressivo falando mais alto.

P.S. : Foi a primeira vez que achei a atriz Kristen Stewart levemente atraente. Decididamente, ela fica muito melhor de cabelos mais escuros e meio sujinha do que aquela boneca de cera sem vida que ela sempre aparece nos filmes posteriores.


Nota: 9

Está disponível no Telecine Play (e seu aplicativo HORRÍVEL!).

BRIGHTBURN


Brightburn (O Filho das Trevas, como foi intitulado no Brasil) é um filme de 2019 dirigido por David Yarovesky e produzido por James Gunn, diretor de Guardiões da Galáxia e do próximo Esquadrão Suicida. Assim como outras adaptações que foram feitas nos quadrinhos, o enredo de Brightburn escrito pelos irmãos de James Gunn Brian e Mark, procura desvendar o que aconteceria se o Superman tivesse se tornado mau após cair na Terra, e embora não haja NENHUMA ligação do filme com o personagem icônico da DC Comics, o que não faltou foram correlações dos fãs do escoteiro kryptoniano com o personagem Brandon Breyer (Jackson A. Dunn).

As semelhanças começam quando o casal Tori (Elizabeth Banks) e Kyle (David Denman) após várias tentativas frustradas de terem um filho pelos meios naturais, acabam tendo suas preces atendidas quando uma espécie de foguete cai no terreno de sua fazenda no Kansas. O objeto voador traz à Terra durante a noite uma forma de vida semelhante a um bebê humano, que o casal decide tomar conta como se fosse seu filho, escondendo de todos a seu redor sua real natureza. Embora não saibam exatamente de onde o bebê veio, Tori e Kyle escondem a nave alienígena embaixo do celeiro e lá a deixam oculta até a pré-adolescência de Brandon.


As semelhanças com a origem do Superman terminam quando após o aniversário de 12 anos, Brandon começa a se comportar de maneira assustadora, como que tendo a mente manipulada por um comando extraterrestre da nave que o manda “conquistar o mundo”. O comando faz com que uma natureza selvagem seja despertada no menino, que começa a agir de maneira a satisfazer seus desejos mais primitivos, como fazer com que a colega de sala Caitlyn (Emmie Hunter) o aceite como amigo à força ou mesmo assassinar aqueles que ao longo do filme vão descobrindo o que ele é capaz de fazer. A partir do ponto em que Brandon aceita seu lado maligno, o filme vira um thriller muito bom que vai surpreendendo o espectador numa escalada impressionante até seu fim dramático. Com seus poderes (que além de voo, rajadas de calor dos olhos parece incluir também telecinésia), Brandon passa a usar um capuz assustador para cometer incólume várias barbaridades em Brightburn, a cidade que dá título ao filme, enquanto deixa sua marca (literalmente!) por onde passa.


O filme rendeu uma 32 milhões ao estúdio que o produziu, o que nos dias atuais não parece ter sido um retorno muito bom. Meio obscura, a produção parece só ter causado algum disse-me-disse no meio nerd mesmo, devido as semelhanças com o Superman. O restante do público “civil” parece ter ignorado o longa completamente. Uma pena, porque eu gostei pra cacete do filme e recomendo.


A cena final ainda é embalada pela música “Bad Guy” da esquisitinha Billie Eilish.

Nota: 8

O filme está disponível no catálogo da HBO Go.   

 

SERGIO


Começo esse tópico completamente envergonhado pela total ignorância a respeito da vida e do trabalho de Sérgio Vieira de Mello, personagem central do filme (de 2020) e também do documentário “Sergio” de 2009, ambos dirigidos por Greg Baker. Após assistir o longa, fiquei completamente sensibilizado pela história de vida desse brasileiro que chegou a ocupar no início dos anos 2000 um dos cargos mais altos dentro do quadro de funcionários da ONU, o de Alto Comissário das Nações Unidas. Amigo pessoal do agora ex-secretário-geral Kofi Annan, Vieira de Mello chegou a ser intitulado como o “homem que queria salvar o mundo” devido à natureza de seu trabalho e o afinco com que o realizava. Formado em Filosofia, ele entrou na ONU aos 21 anos, seguindo de perto a carreira do próprio pai. Embora nunca tenha sido, de fato, um diplomata (porque não representava o Brasil no exterior), de Mello foi chamado assim por muito tempo, agindo com o intuito de apaziguar os ânimos entre nações e poderes.


De forma não-linear, já que vai e volta no tempo algumas vezes durante a projeção, Sergio narra os últimos anos de vida do brasileiro, desde sua intervenção no Camboja (onde ajudou a repatriar milhares de refugiados), passando pela vitoriosa negociação em ajudar a libertar o Timor-Leste do domínio da Indonésia e sua missão final no Iraque pós-Saddam Hussein. O Timor havia sido colonizado por Portugal no século XVI e só foi conhecer sua independência brevemente em 1975, quando então passou a ser ocupado pela Indonésia. Sergio Vieira de Mello ajudou a libertar o país asiático do jugo da Indonésia e por esse feito antes considerado impossível, ele ganhou honrarias na ONU, além do cargo de Alto Comissário.  

Após o fatídico ataque da organização Al-Qaeda aos EUA em 11 de Setembro de 2001, o então presidente George Bush impeliu um forte ataque militar a vários países do Oriente Médio, incluindo o Iraque. Enquanto as tropas militares americanas conseguiam finalmente acabar com o domínio de Saddam Hussein (inimigo que o pai de Bush não conseguiu deter durante a Guerra do Golfo nos anos 90) no país, um novo território começava a surgir para os norte-americanos, agora livre do ditador que comandava o lugar durante as últimas décadas. A missão de Vieira de Mello no Iraque era ajudar a conduzir o país para novas eleições, mas os planos dos EUA, representado na figura do diplomata Paul Bremer, era dominar a área, fazendo com que o Iraque se tornasse uma espécie de colônia deles.

Sergio Vieira de Mello na ficção e na vida real

Baseado quase que totalmente na história real do brasileiro à serviço da ONU, é quase difícil acreditar que o ataque à sede da UN que vitimou Sergio e 21 de seus colegas não foi orquestrada pelos EUA (e o filme chega a dar entender isso), mas a realidade é que um grupo de terroristas se aproveitou da fragilidade do prédio para bombardear o local, colocando um fim na carreira brilhante do diplomata carioca. Embora foque bastante no relacionamento amoroso (muito bem construído, por sinal) entre Sergio e a economista argentina Carolina Larriera, o filme dá um vislumbre geral em quem era o homem por trás do diplomata, o que nos faz sentir sua morte ainda mais. Certamente alguém pacífico como Sergio seria duramente criticado no Brasil intolerante em que vivemos hoje em dia e não demoraria até que fosse chamado de “comunista”, assim como são chamados todos que buscam uma convivência mais pacífica entre as diferenças. O fato é que ele foi uma pessoa única, razão pela qual colecionava admiradores pelo mundo.

A atuação de Wagner Moura é algo de estupenda nesse filme. Que ele é um ator versátil e que topa qualquer desafio na carreira, isso nós já sabemos, mas a forma como ele torna seu Sergio plausível é elogiável. Ao longo do filme, ele não só fala inglês (língua principal do filme e que ele usa muito bem anasalada, sem muito sotaque), como arrisca o espanhol (pelo qual foi criticado na série Narcos onde interpretou Pablo Escobar) e até o francês, além de falar também em português. Ao lado da atriz cubana Ana de Armas (que interpreta a Carolina), ele constrói cenas muito tocantes de cumplicidade e romance, o que nos faz acreditar no amor que existe entre os dois. Aliás, é impossível não ficar apaixonado pela Ana de Armas ao longo do filme! Que mulher maravilhosa!

Wagner Moura e Ana de Armas

Sergio não é um filme com cenas de ação retumbantes ou um enredo dinâmico, mas entretém quem está procurando algo mais tocante e repleto de mensagens belíssimas.

“Eu queria ser uma nuvem, cair em forma de chuva e ficar para sempre na Terra a qual pertenço”.

NOTA: 10

Filme disponível na Netflix.  

 

INFILTRADOS NA KLAN

Vidas Negras Importam

BlacKkKlansman garantiu o Oscar de Melhor Roteiro Adaptado para o diretor Spike Lee em 2019 e com certeza o longa-metragem merecia muito mais atenção, já que disputou outros prêmios na grande celebração do cinema, mas não levou. Baseado no livro homônimo escrito pelo próprio Ron Stallworth, o filme conta com bastante fidelidade a história real do primeiro policial negro do Colorado a trabalhar infiltrado em um caso. Disposto a se tornar um oficial tão qualificado e de destaque quanto os colegas brancos de equipe (enfrentando muito preconceito racial dentro da própria corporação), Stallworth (no filme vivido por John David Washington, filho de Denzel Washington) acaba entrando em contato com membros da Ku Klux Klan, a fim de se infiltrar entre eles e desbaratar um atentado racista que estava prestes a ser colocado em prática. A ironia da história é justamente essa: Um policial negro infiltrado nas fileiras do grupo que defende a supremacia branca em plenos anos 70, quando então os negros começavam a conquistar seus direitos civis nos EUA.

O diretor Spike Lee

Stallworth não esperava que suas investigações o levassem tão longe, mas quando um membro de alta cúpula da KKK exige um encontro pessoalmente com ele, após cair no seu papo de filiação por identificação com a causa "American First" e "White Power", é necessário mandar alguém em seu lugar, quando então surge a ideia de agir em conjunto com o colega policial (e judeu) Flip Zimmerman (na tela vivido por Adam Driver) para se passar pelo Ron Stallworth branco. Na história real, o colega de Ron não é um judeu, fato que Spike Lee adicionou à história para dar um ar ainda mais dramático ao filme, já que além de negros, os supremacistas brancos também odiavam os judeus.

Adam Driver e John David Washington

O enredo consegue nos manter na ponta da cadeira até o final, já que o jogo perigoso dos dois detetives pode ser descoberto pelos racistas a qualquer momento. Para manter seu disfarce até a conclusão da investigação e desmantelar o atentado que prometia vitimar centenas de pessoas inocentes, é preciso que os dois “Ron Stallworth” estejam em perfeita sintonia, o que acaba não acontecendo em alguns momentos.

Laura Harrier

Além das excelentes atuações de Washington e Driver, o filme ainda conta com a atriz Laura Harrier (a Liz Allen de Homem Aranha: De Volta ao Lar) como Patrice, uma ativista pelos direitos dos negros e interesse amoroso de Stallworth e Topher Grace (o Eddie Brock/Venom de Homem Aranha 3) como David Duke, um dos líderes da KKK que tem um encontro interessante com Ron no decorrer da história.

Topher Grace

Nota: 10

Filme disponível no catálogo do Telecine Play.

P.S - Antes dos créditos finais do filme, Spike Lee mostra um compilado de vídeos reais de manifestações recentes (de 2017) de apoiadores de grupos radicais como o KKK, Skinheads e similares, marchando com tochas em mãos nos EUA. São mostrados vários conflitos violentos entre defensores da causa "White Power" e manifestantes contrários, além de um atropelamento covarde que vitimou a ativista de direitos civis Heather Heyer em Charllottesville. No vídeo, o presidente Donald Trump minimiza os acontecimentos em pronunciamento, dizendo que "não havia somente supremacistas brancos" na manifestação com tochas em punho, mas também "pessoas boas". Quem também aparece no vídeo é o verdadeiro David Duke, endossando uma fala do próprio Trump em época de eleição, dizendo que eles (brancos) precisavam retomar os EUA. 

P.S 2 - Nesse momento em que esse post está sendo escrito, os EUA e o mundo estão em campanha contra o racismo, motivada pelo assassinato brutal de George Floyd, um homem afro-americano, por um policial branco chamado Derek Chauvin. O ato causou revoltas na Terra do Tio Sam e o presidente Donald Trump resolveu combater aqueles que tentam lutar por justiça com forças armadas. Além disso, no Brasil, membros do governo federal continuam insuflando grupos de supremacistas brancos e fazendo referências a eles bebendo copo de leite durante lives na internet. 

Pelo visto, o racismo é algo que ainda vai precisar ser combatido por muito tempo na sociedade e não é coisa só de cinema. #VidasNegrasImportam #BlackLivesMatter  

ROCKETMAN


Confesso que eu era bem ignorante quanto à carreira musical de Elton John antes de Rocketman, e tudo que eu sabia sobre o artista era seu gosto extravagante para roupas e suas músicas mais populares que tocavam nas rádios AM que minha mãe ouvia antigamente. Lembro também que uma vez apareceu um LP lá em casa do Elton John e que eu tinha pirado na sua interpretação com o George Michael para “Don’t Let me Sun Go Down on me” desse disco. O meu pai tinha uma fita cassete dos melhores hits dele, entre elas uma que eu gosto até hoje, “Nikita”.

Com o aval do cantor inglês, o filme Rocketman (baseado em uma “fantasia real”) dirigido por Dexter Fletcher (o mesmo que salvou o que pode em Bohemian Rhapsody, após a demissão de Bryan Singer do projeto) não é só uma homenagem a Elton John como também um diário aberto para o mundo sobre a carreira de um dos artistas mais talentosos e polêmicos da música. Apesar de na infância ser um garoto tímido e retraído pela severidade do pai e a quase indiferença da mãe, Reginald Dwight (seu verdadeiro nome) se mostrou um virtuoso musicista, mostrando talento no piano desde sempre. A formação erudita não o impediu de alçar voos mais altos e foi na loucura do Rock’n Roll que Dwight conheceu o parceiro musical Bernie Taupin, com quem dividiu o sucesso de suas grandes canções (letras em sua maioria escritas por Taupin) se tornando então Elton John.

Bernie Taupin (Jamie Bell) e Elton John (Egerton)

O filme não é bem uma cinebiografia, mas procura contar com certa fidelidade as lembranças de John, que participou de grande parte do processo criativo com o marido e cineasta David Furnish. Muito do que acontece no filme como o envolvimento com drogas, os relacionamentos tóxicos, o descaso do pai autoritário, o casamento fracassado com uma amiga (apesar de já ter se declarado gay na época) e até mesmo a tentativa de suicídio são fatos da vida do pianista, contados na tela de uma maneira fantasiosa às vezes (e é aí que entra a genialidade do filme) e nos colocando em meio a delírios e devaneios da mente do inquieto e solitário Elton John.

Taron Egerton e Richard Madden

A direção de Fletcher acerta em quase tudo, nos contando de uma maneira comovente a vida conturbada de uma estrela do Rock da sua ascensão à queda, mas é na direção de elenco que o diretor mostra que estava muito mais inspirado em Rocketman do que em Bohemian Rhapsody. Taron Egerton dá vida ao jovem Elton John de maneira muito efusiva, dando um show de interpretação e realmente vivenciando o espetáculo. Diferente de Rami Malek que apenas simulava os momentos musicais de Freddie Mercury no filme sobre o Queen (e isso não podemos culpar o coitado, já que NINGUÉM conseguiria interpretar a potência vocal de Mercury além dele mesmo!), Egerton entrou na dança de corpo e alma, cantando ele mesmo as músicas de Elton John no filme. A música "(I’m Gonna) Love Me Again", que concedeu ao músico o Oscar de Melhor Canção Original de 2020 (e único prêmio que a produção venceu pela Academia) é interpretada por John em parceria com Egerton, que desempenhou em Rocketman com certeza o melhor papel de sua carreira até aqui.


O elenco ainda conta com as presenças de Bryce Dallas Howard como a mãe de John, Richard Madden (o Rob Stark de Game of Thrones) como o amante tóxico do pianista, Jamie Bell como o amigo Bernie Taupin e o talentosíssimo ator mirim Matthew Illesley, que encena as sequências mais emocionantes do filme, interpretando o Reginald Dwight na infância.

Bryce Dallas Howard e Matthew Illesley

Vale para quem nunca antes foi um grande fã de Elton John (como eu) e deve valer ainda mais para quem é fã do artista mais multifacetado da cultura pop.

NOTA: 9

Está disponível nas plataformas Telecine Play e Sky Play.    

RESGATE


Numa época em que dá pra fazer quase tudo no cinema com alguns milhões de dólares de produção e um CGI cada vez mais realista, é muito difícil inovar no cinema de ação, mas é o que o diretor Sam Hargrave e os produtores Joe e Anthony Russo procuraram fazer em Extraction (2020), filme protagonizado por Chris Hemsworth.

Com cenas alucinantes de perseguição de carros e um plano-sequência assustador e claustrofóbico (aquele em que embarcamos de carona com os personagens em meio a um tiroteio no meio do filme), Resgate consegue prender a atenção do espectador do começo ao fim, mesmo com um enredo meio batido de extração de um refém, executada por um caçador de recompensas. Sério. Nós já vimos esse plot em pelo menos uns 25 mil filmes, mas é a forma como isso é mostrado graficamente para quem está assistindo é que conta aqui.

Chris Hemsworth como Tyler Rake

Da mesma escola de David Leitch, que também era dublê e diretor de coreografias de luta em Hollywood, Sam Hargrave participou da coordenação de dublês nos filmes da Marvel dirigidos pelos Irmãos Russo. Com um faro apurado para as cenas de ação (assim como Leitch) por estar fortemente ligado ao meio, era natural que o cara acabasse se tornando um excelente diretor de filmes de ação, e isso ele mostra muito bem nas quase duas horas de Resgate. Não há como não comparar o estilo de luta franca e realista do personagem Tyler Rake com a de John Wick da franquia estrelada por Keanu Reeves, e acho que exatamente por isso o filme acabou ganhando um burburinho mais alto por aí. Com o passar do tempo, cenas mal coreografadas ou entupidas de CGI para disfarçar a péssima qualidade de direção nos filmes de tiroteio meio que cansaram o público. A pegada John Wick com lutas mais próximas da realidade e o famoso tiro na cara repentino hoje parece fazer mais o gosto da galera.


Eu tenho defendido esse jeito mais “sincero” de fazer filmes de ação ultimamente no Blog e o que não faltam são elogios para as cenas dirigidas pelos Irmãos Russo nos filmes da Marvel (que mesmo usando CGI sabem coreografar muito bem um bom quebra-pau) e o próprio David Leitch que colaborou nos filmes de John Wick, dirigiu o excelente Atômica e mandou bem em algumas lutas de Deadpool 2, pelo menos as que não contavam com o CGI péssimo da Fox.


Já há quem queira um crossover entre John Wick e o Tyler Rake de Chris Hemsworth e o público só teria a ganhar com isso, embora algo dessa natureza seja praticamente improvável. O filme agradou tanto que já se comenta sobre uma continuação, algo sim muito plausível para a dona Netflix que adora fazer umas continuações de$nece$$ária$.

Rake versus Wick

Mas Rodman... E o enredo?

Caçador de recompensas é contratado para resgatar o filho adolescente de um perigoso chefe da máfia, mas no meio do caminho acaba se afeiçoando ao moleque, arriscando a missão pelo qual ele não seria pago. Fim.

Nota: 8

Como já mencionei, o filme está disponível exclusivamente na Netflix.

E você? O que tem visto nessa quarentena além do presidente [INSIRA AQUI O NOME DO SEU PRESIDENTE] falando merda todos os dias na TV?

NAMASTE!

31 de agosto de 2019

Crítica – Era Uma vez em Hollywood


Em 1969 o autointitulado “guru” Charles Manson protagonizou um dos capítulos mais aterrorizantes de Hollywood ao encomendar o assassinato da atriz Sharon Tate e seus amigos em uma residência da Cielo Drive. Atrás de uma fama que não conseguia e com a ideia fixa de que ele era a reencarnação de Jesus Cristo, Manson e seus seguidores iniciaram uma cruzada racista e preconceituosa em Los Angeles, cidade para o qual ele se mudou em busca de seu sonho de se tornar um músico tão bem-sucedido quanto John Lennon, seu ídolo. Rejeitado por vários produtores musicais devido a qualidade duvidosa de sua “obra”, o guru com suas alucinações decidiu se vingar, o que acabou levando seu bando ao endereço na Califórnia, onde Sharon Tate morava com o marido cineasta Roman Polanski

Tate havia participado de diversos filmes como “Olho do Diabo” (1966), “A Dança dos Vampiros” (1967) e “O Vale das Bonecas” (1968), e estava grávida de oito meses quando foi brutalmente esfaqueada e morta em sua casa. Levou-se muito tempo para que as investigações da Polícia ligassem o crime chocante a Manson e a seu culto, mas ele e seu bando (em sua maioria mulheres) foram levados à justiça. Os hippies seguidores de Manson moravam no Rancho Spahn e se alimentavam de restos das lixeiras enquanto perambulavam pela cidade em busca de mais seguidores para a seita. O Rancho anteriormente era usado como set de gravação de filmes de faroeste, e quando foi abandonado, serviu perfeitamente para os planos de Charles de aterrorizar Hollywood.

Essa é a realidade dos fatos.

Era Uma Vez em... Hollywood é uma história fictícia que insere os personagens Rick Dalton (Leonardo DiCaprio) e Cliff Booth (Brad Pitt) em meio aos acontecimentos reais do trágico ano de 1969, mas não deixa de prestar uma homenagem à indústria cinematográfica norte-americana da época. 

No final da década de 60 os filmes de faroeste em preto e branco começavam a dar lugar a outros gêneros como comédias e espionagem, e o enredo principal é focado em Rick Dalton, um ator cuja carreira está em franca decadência enquanto ele envelhece e não consegue mais papeis de destaque. Ao lado do inseparável amigo Cliff, que é seu dublê e “faz-tudo” na casa onde ele mora em Cielo Drive, Dalton conhece o produtor Marvin Schwarz (Al Pacino) que o faz enxergar que sua carreira como vilão de bang-bang está perto do fim em Hollywood, e que seu destino é mesmo estrelar os "faroestes spaghetti" na Itália. 


Apesar de abalado com a possibilidade de ter que se mudar para salvar a carreira, Dalton continua cumprindo seus compromissos com os seriados de TV americanos em papeis menores, enquanto Cliff, ex-boina verde e acusado de ter assassinado a própria esposa, está em busca de emprego. A casa onde Dalton mora é vizinha da de Sharon Tate (Margot Robbie) e Polanski (Rafal Zawierucha) na Cielo Drive, mas não há interação entre os personagens quase até o final do filme, o que causa uma certa apreensão no espectador que conhece a história trágica do casal.


O ritmo que Quentin Tarantino impõe a seu nono filme (lembrando que ele diz que vai se aposentar depois do décimo!) é levemente diferente dos outros, o que denota um amadurecimento em sua forma de contar uma história. O roteiro de Era Uma Vez... é nitidamente uma homenagem ao cinema que ele cresceu assistindo – Tarantino nasceu em 1963 – e além das projeções que são exibidas o tempo todo, seja na tela do cinema visitado por Sharon Tate ou nas telinhas da TV, as cenas exalam Western e todo aquele clima glamouroso que gira em torno de Hollywood, algo que Charles Manson e seu bando tentaram perverter.


Apesar disso, esse novo ritmo imposto pelo diretor é bem lento e causa uma certa ansiedade, já que temos uma ideia do que ele quer contar, mas não vemos nem sombra disso na linha principal do roteiro. 

Damon Herriman e Al Pacino
Nós vemos Charles Manson - vivido pelo ator Damon Herriman e em dose dupla, porque o ator faz o mesmo papel na segunda temporada de Mindhunter - uma única vez nos portões da Cielo Drive, depois ele é citado muitas vezes já no Rancho Spahn, quando Cliff dá uma carona para “Pussycat” (Margaret Qualley), nós vemos os hippies da seita de Manson perambulando para lá e para cá, nós vemos Sharon Tate aproveitando sua quase-fama e curtindo com os amigos (inclusive dentro da Mansão da Playboy), e nós somos distraídos pelas desventuras de Dalton e Booth enquanto isso. Por duas looongas horas.

É como se estivéssemos esperando o tempo todo o desfecho do filme, esquecendo de curtir os pormenores, marca indelével de Tarantino atrás das câmeras. Todos os detalhes estão lá: Close em pés femininos (paixão do diretor), silêncios onde podemos apreciar as expressões de um ator em sua atuação, as músicas muito bem encaixadas (e subitamente interrompidas também), muitas cenas a bordo de veículos, onde pegamos uma carona com o motorista no banco de trás, e claro, violência desenfreada!


O elenco de Era Uma Vez em... Hollywood é bem extenso e variado. As figurinhas carimbadas nos filmes de Tarantino estão lá novamente, como Michael Madsen, Zoë Bell (a dublê de Uma Thurman em Kill Bill) e Kurt Russel fazendo papeis menores, mas o roteiro dá espaço para todos eles. O veterano Bruce Dern brilha como o frágil e cego George Spahn, dono do Rancho e antigo conhecido de Booth nos tempos de dublê; Emile Hirsch vive Jay Sebring, o melhor amigo do casal Polanski (que na história real acaba sendo assassinado com Sharon); Ganha destaque ainda a ex-atriz-mirim Dakota Fanning como Lynette, a amante de George Spahn, Damian Lewis como Steve McQueen e Maya Hawke (a Robin da terceira temporada de Stranger Things), filha de Uma Thurman e Ethan Hawke, que faz uma das hippies que moram no Rancho (especificamente a que diz que esqueceu a faca no carro e se manda!).

Emile Hirsch e Dakota Fanning

Quem rouba mesmo a cena, atuando ao lado de Leonardo DiCaprio, enquanto seu personagem aguarda para filmar a série de TV que co-protagoniza, é a pequena Julia Butters de 10 anos. Com um diálogo firme e consistente, ela impressiona, dando vida a uma jovem atriz-mirim que não gosta de sair do personagem enquanto está no set. As cenas em que ela e DiCaprio atuam juntos chegam a ser engraçadas, e a pequena dá conta do recado, entregando muito bem seu texto. Metalinguagem pura... Uma atriz mirim que interpreta uma atriz-mirim que não gosta de sair do personagem... Vixe!
Julia Butters em cena com DiCaprio

Outro destaque do filme é a atriz Margaret Qualley que com sua Pussycat, uma das ripongas juvenis de Manson, não se envergonha em se insinuar para Cliff, que a leva até o Rancho no carro de seu amigo e chefe. Vale lembrar que a personagem de Qualley representa a liberdade sexual que a comunidade de Manson pregava, onde todos transavam com todos em Spahn enquanto bebiam e se drogavam, e isso acabou sendo comprovado nos depoimentos reais dados pelas representantes da seita de Manson quando estas foram presas pelo assassinato de Sharon Tate. 


Não devo ser o único espectador que sai de casa para ver o novo filme de Quentin Tarantino independente da história ou de quem está protagonizando, mas por se tratar de um roteiro fictício que se passa em meio a fatos, tem certos elementos que esperamos que aconteça na tela e é aí que o diretor de 56 anos surpreende, levando o enredo para um caminho completamente inesperado. Lembra o que aconteceu com Hitler ao final de Bastardos Inglórios (2009)? É mais ou menos por aí que a coisa anda em Era Uma Vez em... Hollywood, e isso não enfraquece o filme, que como o próprio título insinua, é um faz de conta

Tarantino prova que ainda está em forma depois de algumas décadas por trás das câmeras. A sequência final da invasão dos hippies ao endereço da Cielo Drive e tudo que acontece entre eles e os personagens de Pitt e DiCaprio chega a ser revigorante, premiando o espectador por ter esperado todo aquele tempo pelo rompante de violência tão característico na filmografia do diretor. 

Enquanto os personagens fictícios ganham até certa relevância com o roteiro, falta mais profundidade à Sharon Tate de Margot Robbie. 

Ela passa um ar de inocência e doçura com sua interpretação – Tirando ainda o fato de que Robbie é linda que dói – mas a personagem mais parece um bibelô de luxo no filme do que alguém realmente importante e profundo. 

Uma das críticas ao filme, aliás, é a forma superficial com que Tarantino (que também escreve a história) trata as mulheres no filme, a famosa “objetificação feminina” (com closes em bundas e pernas). Para quem conhece o estilo “tarantinesco”, porém, não é uma grande surpresa e não chega a ofender. Vale lembrar que o cara deu não só um, mas DOIS filmes dedicados a uma das personagens femininas mais badass motherfucker do cinema: Beatrix Kiddo de Kill Bill. E isso fala por si próprio sobre a superficialidade de suas personagens femininas. 


Só lamentei não ter tantas referências cinematográficas para curtir plenamente as homenagens que Tarantino faz ao longo de Era Uma Vez... Além dos filmes, muitos atores, atrizes e diretores são lembrados, e a relação de elenco mostra muitos “easter-eggs” desse tipo, dos quais deixei passar muitos. 
Uma das sequências que mais me empolgaram no trailer foi a que Brad Pitt enfrenta o próprio Bruce Lee (interpretado por Mike Moh), mas no filme serve apenas como uma piada em que Cliff Booth se imagina de volta ao set de filmagens, caindo na porrada com Lee e VENCENDO! Toda a forma arrogante com que Lee é representado no filme parece bem desrespeitoso, e isso repercutiu negativamente com os familiares do ator chinês e seus amigos. 

Em meus devaneios, por algum instante vendo esse trailer outrora, eu achei que Tarantino tinha usado imagens reais de Bruce Lee e inserido Brad Pitt na cena, mais ou menos como aconteceu em Forrest Gump, onde Tom Hanks acaba colocado em vários momentos famosos da história americana... Mas não foi bem assim que aconteceu.

Perto de Os Oito Odiados (filme que caracterizo como o mais fraco da carreira de Tarantino), Era Uma Vez em... Hollywood é uma obra de arte. Tem alguns problemas de ritmo, cria expectativas que não são saciadas, demora para engrenar, mas entrega um enredo muito bom de ser assistido e apreciado, no melhor estilo Quentin Tarantino, que continua sendo para poucos.

NOTA: 8,5

Há muito tempo numa galáxia muito, muito distante eu escrevi sobre Django - Livre aqui:


Kill Bill (Vol. 1 e Vol. 2) aqui:


E um Top 10 Trilha Sonora de Tarantino aqui:


P.S.  - Pela primeira vez NA VIDA Brad Pitt está começando a aparentar a idade que tem, e a carinha de neném característica já não consegue mais ser vista embaixo das rugas que abundam em seu rosto... Mas olha o físico desse filho da mãe! O cara tem 55 anos com corpinho de 25. É muita humilhação para nós pobres mortais! 


NAMASTE!

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